sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

O FENÔMENO DAS IGREJAS INCLUSIVAS NO BRASIL

 




Paolo Cugini

 

Há um fenômeno religioso interessante, estimulado pela presença LGBT na sociedade, que envolve comunidades cristãs no Brasil há mais de vinte anos. Este é o fenômeno chamado: igrejas inclusivas , que diz respeito àquelas realidades eclesiais que não apenas abriram as portas de suas igrejas aos cristãos LGBT ao longo do tempo, mas, em vários casos, propuseram mudanças significativas nos conteúdos teológicos, que costumam definir a 'homossexualidade . O fenômeno das igrejas inclusivas no Brasil diz respeito sobretudo ao mundo evangélico, ou seja, aquelas denominações eclesiais muito difundidas no território brasileiro, que remetem à experiência protestante. Relato abaixo alguns dados e conteúdos resultantes de algumas pesquisas produzidas nos últimos anos em universidades brasileiras, que tentaram descrever e analisar o fenômeno (as pesquisas utilizadas estão relatadas no final do artigo).

Em comparação com as práticas religiosas das igrejas ditas convencionais, nas quais o diabo e os traumas familiares são usados como justificativas para a homossexualidade, nas igrejas inclusivas ocorrem deslocamentos discursivos que buscam retirar a diferença sexual da área do pecado de acordo com natureza. A etnografia das comunidades inclusivas destaca, assim, os vínculos entre religião, sexo e política em torno da produção de discursos positivos em prol da diferença. Não se trata de exercer secretamente a sexualidade gay ou lésbica, como acontece com muitos fiéis homossexuais que vivem em vínculo tenso com igrejas evangélicas pentecostais, “ mas de defender ideais de visibilidade e aceitação social da sexualidade que fogem da norma ”. As regras de conduta do culto inclusivo não proíbem o exercício de relações homossexuais ou expressões de identidade LGBT. Nesses grupos, liderados por pastores gays e lésbicas, a vivência de uma orientação diferente da norma heterossexual é considerada uma prática que não viola os códigos de santidade. A teologia inclusiva, em geral, questiona o dogma religioso que condena a homossexualidade, procurando oferecer leituras bíblicas alternativas, que visem apagar os estigmas que afetam a diversidade sexual. Iniciativas de inclusão estão surgindo em todo o Brasil, com seus discursos de afinidade eletiva com as demandas dos movimentos cristãos. Assim, há muitos papéis que podem ser preenchidos por gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais em igrejas inclusivas.

Existem duas redes nacionais de grupos cristãos LGBT no Brasil: a Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT e Evangélicos pela Diversidade. É possível observar que esse movimento tem abrangência nacional: a rede católica conta com 21 grupos atuantes em 16 cidades brasileiras, enquanto “E vangelici per la Diversity ” tem coletivos em 9 capitais. No total, são 30 grupos cristãos LGBT ligados a essas duas redes nacionais (os dados referem-se a uma pesquisa de 2021). A rede de “ Evangélicos pela Diversidade ”, por sua vez, não faz parte de nenhuma rede global ou internacional, embora mantenha diálogo com grupos e entidades de outros países. Em entrevista, Bob Botelho , coordenador executivo da entidade, disse que: “ Devido à grande diversidade de denominações evangélicas e a estrutura de autonomia de cada uma, além do catolicismo, é difícil criar uma rede internacional de grupos LGBT cristãos desta natureza ". Há também igrejas e instituições religiosas já criadas dentro de uma perspectiva de acolher pessoas LGBT em espaços cristãos, principalmente evangélicos. Essas igrejas diferem das demais, entre outros fatores, na celebração de casamentos LGBT e no acesso de pessoas LGBT aos cargos de sacerdócio e liderança.

Algumas das igrejas cristãs tradicionais também reformaram seus cânones para melhor acomodar a população LGBT. A Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, após mais de 20 anos de discussões, decidiu autorizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo em seus templos. Criada no século XVI na Inglaterra, tornou-se uma congregação de alcance internacional, a partir do processo de colonização e do imperialismo britânico. Atualmente, está travando uma dura batalha interna em relação à inclusão de mulheres e LGBT. Enquanto o casamento gay continua sendo proibido na Igreja da Inglaterra, a Igreja Episcopal dos Estados Unidos passou a reconhecer esse tipo de união desde 2015 e a Igreja Episcopal da Escócia em 2017. No Brasil, esse conflito causou uma cisão no Igreja Anglicana. Os debates começaram em 1997 e continuam até hoje. Em 2005 as dioceses de Recife, João Pessoa e Vitória, localizadas no nordeste do Brasil, separaram-se da nacional e criaram a “ Igreja Anglicana do Brasil ”. Em seu portal institucional, a igreja alega que seus pastores foram excomungados pela Igreja Episcopal Anglicana do Brasil “ por estarem em desacordo com essa denominação quanto à normalidade da prática homossexual e à ordenação de pessoas que a praticam ao sagrado ministério pastoral ” . (ANGLICANA NO BRASIL, 2020).

Entre as muitas experiências eclesiais inclusivas que podemos citar, indicamos uma como exemplo: a comunidade cristã Nova Esperança (CCNE) criada em 2004 na cidade de São Paulo por fiéis da Igreja de Acalanto , incluindo o pastor Justino Luiz, que se tornou presidente da congregação. No site da instituição consta que “ a CCNE é uma igreja evangélica pentecostal que prega uma teologia inclusiva, nesta comunidade todos são bem vindos, independente de sua orientação sexual, cor, raça, somos uma igreja que acolhe toda diversidade humana ” ( CCNE, 2020). O site também indica os nove endereços do CCNE no Brasil e dois no exterior (Argentina e Portugal).

Além das igrejas e grupos já apresentados, com dimensão mais nacional, há uma série de movimentos locais dentro e fora das congregações tradicionais para abrir espaços de discussão sobre as questões da diversidade sexual e de gênero, também em diálogo com as questões raciais, para a inclusão de pessoas com deficiência, pobres ou sem-teto. Em Brasília, por exemplo, destaca-se a Comunidade Família Cristã Athos , uma igreja inclusiva que tem entre seus participantes o teólogo Alexandre Feitosa .

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FAGNER ALVES MORELIRA BRANDÃO, Religião e omossexualidade. Uma abordagem histórica e sociocultural das igrejas cristãs inclusivas em Goiás , Dissertação de Mestrado da Universidade Estadual de Goiás, 2021.

MARCELO VARES NATIVIDADE, Cantar e dançar para Jesus: sexualidade, filho-de-lei e religião nas religiões inclusivas pentecostais, Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, 37 (1): 15-33, 2017.

LILIA DIAS MARIANNO, Diversidade de genro em ambiente religioso: ética relacional para um organismo ciborgue , Mandrágora, Universidade Metodista de São Paulo, v.27, n. 2, 2021, pág. 237-267.

FATIMA WEISS DE JESUS, Igrejas inclusivas em perspectiva JESUS (da inclusão radical, Seminário Internacional Fazendo 10Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN2179-510X.

 

 

 

Um comentário:

  1. No silêncio do pensar veio Jesus filho de da luz,nosso pai Deus libertadores continuemos nessa linha social na Língua Portuguesa tentando classificação gramatical pra Deus não entra gênero masculino/masculino sendo assim sequisualidade é algo necessário bonito,sem pecado que merecemos respetarmo,pois o bem não têm gênero,alma não têm sexos,se exercitemos as diferenças o o reino de Deus nascerá...

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