sexta-feira, 3 de outubro de 2025

A TEOLOGIA DE BAIXO: UM CAMINHO PARA UMA TEOLOGIA CONTAMINADA

 



Paolo Cugini

 

No panorama contemporâneo da reflexão teológica, cresce a necessidade de uma teologia que saiba ouvir a realidade, uma teologia de baixo capaz de captar a ação do Espírito Santo dentro da história concreta.  Essa perspectiva se apresenta como uma alternativa viva à teologia ocidental de tipo dedutivo, que frequentemente fórmula dogmas a partir de conceitos abstratos, correndo o risco de perder o contato com a experiência das pessoas e com aquilo que o Espírito Santo prepara no cotidiano.  A teologia de baixo nasce da experiência, do encontro com o outro, da escuta das perguntas que emergem das dobras da história e das feridas da humanidade.  Nessa abordagem, a reflexão não parte de princípios universais abstratos, mas da concretude da vida, das histórias de homens e mulheres que buscam sentido e salvação. “A realidade supera a ideia”, diria o Papa Francisco, resgatando a exigência de não se fechar em esquemas estáticos, mas de se deixar interpelar pela história.

Essa abertura à realidade não é apenas método, mas também conteúdo: é aqui que o Espírito Santo age, transforma, prepara novos caminhos.  A teologia de baixo se torna, assim, uma teologia contaminada, ou seja, capaz de se deixar interpelar e modificar pelo contato com a vida real, pelas culturas, pelas mudanças sociais, pelos sofrimentos e pelas esperanças dos povos.  A teologia ocidental, sobretudo em sua forma mais dedutiva, privilegiou frequentemente a formulação de dogmas a partir de conceitos abstratos, por vezes se afastando do contexto histórico e da realidade vivida.  Esse método, que tem suas raízes na filosofia grega e na escolástica medieval, certamente garantiu a coerência e a profundidade do pensamento cristão, mas corre o risco de se tornar autorreferencial. O perigo é o de uma teologia in vitro, que analisa a fé como um objeto de laboratório, sem se deixar contaminar pela vida, e, pior, se defendendo dela.  Dessa forma, a reflexão teológica pode perder sua força profética e seu dinamismo, não conseguindo captar aquilo que o Espírito Santo está preparando na história através das novidades, das crises, dos desafios e das transformações.  Este é, talvez, um dos problemas mais evidentes no debate teológico contemporâneo, no qual é visível a incapacidade da teologia oficial e do Magistério eclesial de dialogar com os temas que a vida cotidiana aponta como urgentes.  Uma teologia que se defende da vida, para proteger seus princípios absolutos, considerados inegociáveis, está destinada a ficar de fora dos jogos da vida real e, a longo prazo, a ser ignorada no debate que busca soluções para os problemas existenciais.

Ao contrário, uma teologia contaminada é uma teologia que aceita o risco do encontro, da encarnação, da mistura.  Não teme sujar as mãos na história, de se confrontar com aquilo que é novo, diferente, imprevisto.  É uma teologia que reconhece que o Espírito Santo age não apenas nos locais institucionais ou nos dogmas consolidados, mas também e, sobretudo, nas periferias, nas perguntas incômodas, nas mudanças sociais, nas lutas por justiça. Essa perspectiva lembra o modelo bíblico, onde Deus se revela na história concreta de um povo, através de acontecimentos muitas vezes marcados pela dor e pela esperança. A teologia de baixo, contaminada pela realidade, torna-se então um lugar de discernimento, de escuta, de criatividade, capaz de gerar novas sínteses e novos caminhos para a fé.  É nos caminhos da história que o teólogo deveria estar, para se colocar em escuta, e elaborar uma teologia com cheiro de terra e água, de vida vivida e não de cheiro de livros e estantes.  Em um mundo em rápida mudança, a teologia não pode se contentar em repetir fórmulas abstratas, mas deve se colocar à escuta da realidade, permitindo-se ser contaminada pela história e pelas perguntas que emergem do cotidiano.  Somente assim poderá realmente captar a ação do Espírito Santo, que continua a preparar novos caminhos para a Igreja e para a humanidade. A teologia de baixo convida a deixar as margens seguras da abstração para navegar no mar aberto da vida, onde o Espírito sopra e renova todas as coisas.

 


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