terça-feira, 24 de dezembro de 2019

SANTO NATAL 2019






Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido envolvido em faixas e deitado numa manjedoura Lc 2, 12

É isso que chama atenção, o contraste absurdo, aquilo que ninguém podia imaginar, ou seja, que o sinal da presença do Salvador na terra fosse algo de tão pobre e simples: um recém-nascido envolvido em faixas e deitado numa manjedoura. Nada de vestimentas sacerdotais, nada de trajes sagradas, nada de algo que pudesse marcar uma distância, uma separação com o mundo – pois é isso o sentido da palavra sacro: separado mas uma presença que todo mundo pudesse reconhecer. É isso que Deus, desde o começo quis realizar com a humanidade: uma aproximação. Toda vez que nos aproximamos dos outros, sobretudo os mais pobres e humilde, tornamos presente o menino Jesus para que o mundo o veja e acredite. Toda vez que marcamos distancia, com a nossa roupa, com o luxo, com algo que é sinal de desigualdade, afastamos a possibilidade da humanidade encontrar o Senhor. Um santo Natal.
Pe Paolo

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

POR DENTRO DO SINODO PAN-AMAZONICO

O Papa Francisoc ao Sínodo rodeado com as mulheres que participam dos trabalhos



Muitas coisas estão acontecendo em Roma no Sínodo Pan;Amazonico e muita conversa está saindo nas redes sobre assuntos que nem tudo mundo entende. O amigo pe Luís Miguel Modino, que trabalhou na diocese De Ruy Barbosa e á alguns anos está trabalhando em Manaus, é um parceiro do Instituto Humanitas Unisinos – IHU que acompanhou toda a preparação do Sínodo e agora está em Roma acompanhando atentamente os debates. Diariamente, e em uma página especial, o IHU publica notícias e textos que repercutem as reuniões sinodais. Por essa razão, e para ajudar as pessoas a entenderem o que está se passando no Sínodo, publico a intervista que Pe Modino realizou com o teólogo Pe Paulo Suess, que é perito do Sínodo. Pe Paulo Suess é doutor em Teologia Fundamental, fundador do curso de Pós-Graduação em Missiologia, na então Pontifícia Faculdade Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo, assessor teológico do Conselho Indigenista Missionário - Cimi e professor em várias Faculdades de Teologia no ciclo de Pós-Graduação em Missiologia.



Pe Modino – Qual a importância da promoção de uma discussão como essa do Sínodo Pan-Amazônico, de uma Igreja com rosto indígena, com rosto amazônico?
Paulo Suess – Vai ser muito importante, pois nós criaremos raízes como Igreja. E, nas igrejas locais, passaremos de uma Igreja de visita para uma igreja de presença. Isso vai tocar todo nosso esquema, inclusive a nossa identidade católica. Se falou, hoje mesmo num grupo, dessa indentidade cattolica. Precisamos aprofundar os estudos bíblicos, estudos catequéticos, mas, às vezes, se esquece o essencial dessa identidade, pois ela anda com duas pernas: com a palavra e com o sacramento.
 No que diz respeito à palavra, é relativamente fácil, pois basta aprofundar o que já fizemos, o que as igrejas pentecostais fazem, e ampliar a palavra. Mas, com a palavra somente, podemos tirar os altares das nossas comunidades. Então, a palavra pode ser feita pela visita, pela internet, por um curso em que aprofundamos e mandamos literatura depois. Agora, o sacramento exige a mudança, o câmbio de uma igreja de visita para uma igreja de presença. E tal só pode ser feito estando presente. Então, essa outra perna, essa outra parte da identidade católica que é o sacramento, ao lado da palavra, exige uma igreja descentralizada, uma igreja que passa a ser presente.
E, uma vez já sendo presente, vai ser mais barato, porque se queixam que na Amazônia é tudo muito caro, precisa de muito dinheiro para gasolina, para chegar nos locais, viajar. Então, se é assim, que fiquemos lá. Assim, não se precisa mais pagar a gasolina porque você é da comunidade. Ou seja, é fazer ser da comunidade esses ministérios. Só quando esses ministérios são da comunidade haverá também uma presença sacramental e uma presença da palavra.
Creio que o novo caminho poderia ser este: o que fizemos com visitas, o que fizemos com gente de fora pode passar a ser feito com gente do local. Isso não quer dizer que vamos substituir a missionalidade, pois essa igreja local também vai ser missionária. A partir de uma igreja com rosto amazônico, vai ser missionária não alienante, não colonizadora, uma igreja mesmo segundo o espírito de Jesus que se encarnou nesse mundo.

Pe Luis Miguel Modino


Pe Modino – Como avalia as primeiras movimentações do Sínodo? O que o senhor destacaria dos debates nesses primeiros dias?
Paulo Suess – É um grande balaio, uma cesta em que apareceu tudo. E apareceu tudo com uma grande liberdade. Eu estive aqui, certa vez, participando do Sínodo para as Américas e na ocasião havia temas proibidos. Não se poderia falar porque o Papa não queria. Agora não, não há proibições estruturais. Um ou outro cardeal quer proibir alguns temas, acha inconveniente falar de algumas coisas e gostaria de fechar algumas questões. Mas, a partir da presença do Papa Francisco, tudo está aberto, tudo está interligado e com isso apareceram todos esses temas.
Agora, vai depender muito da redação, dos primeiros esquemas, capítulos, o que se aproveita a partir também dos grupos, porque atualmente estamos todos com um leque de temas. Já iniciamos o segundo passo essa semana, a construção do documento final. É nesse momento que vai depender muito das escolhas desse balaio, o que tiramos e realmente achamos como um novo caminho que estamos procurando.

Pe Modino – E nos cafés, nas residências e em outros encontros que vão ocorrendo, nos bastidores, o que está sendo comentado?
Paulo Suess – Eu estou sentindo que estamos com certo otimismo. Se conhece a máquina e como ela funciona, se conhecem as forças presentes, porém, numericamente, ao menos, há muitos que querem andar nesses novos caminhos. Nesses 500 anos aqui, nos tornamos de uma igreja majoritária em uma igreja minoritária, porque ocuparam os espaços que deixamos abertos por causa da centralização dos ministérios. Por isso, creio que a maioria vai compreender que descentralizando os ministérios vamos marcar presença e vamos poder retomar, de uma certa maneira, essa Amazônia com espírito do Evangelho que luta por justiça e liberdade e contra a violência e tudo que observamos na análise da realidade.

Pe Modino – O Sínodo tem sido um momento muito elogiado, mas também muito criticado, inclusive dentro da própria Igreja. Essas críticas estão incidindo de alguma maneira dentro da assembleia sinodal?
Paulo Suess – Creio que não tenha um impacto. Porém, é bom observar as vozes contrárias, analisar seus motivos, que às vezes são pessoais, sentir como pode ser uma quebra na sua trajetória profissional aqui em Roma, porque agora a linha é outra e eles ainda não se deram conta do espírito da época em que vivemos. Então, a gente escuta e procura esvaziar os argumentos que muitas vezes não são argumentos, são apenas autodefesas apenas para continuar assim como sempre se fez e com isso estamos fora do processo histórico em que se desenvolve a evangelização.

O teologo Paulo Suess com o Papa Francisco


Pe Modino – Esse Sínodo é o que conta com mais presença feminina. Até agora, nesses primeiros dias, como estão se posicionando as mulheres dentro da Assembleia Sinodal?
Paulo Suess – O Sínodo é um sínodo de bispos e não de leigos, de padres nem de mulheres. Porém, sempre que são mencionados temas candentes para as mulheres se percebem os aplausos, as interrupções, as satisfações e se vê em todos os casos a presença das mulheres. Assim, embora não tenham a presença, a força pelo voto se introduz mais pela força do argumento.

Pe Modino – E, pessoalmente, o que mais o marcou até agora?
Paulo Suess – Essa abertura, em que se pode falar de tudo, em que há um grande consenso sobre os novos caminhos, sobre a descentralização, sobre a ministerialidade, sobre o rosto amazônico. Eu cheguei na Amazônia em 1966, trabalhei dez anos em diferentes regiões, depois trabalhei com a questão indígena. Por isso, a questão do rosto amazônico é bálsamo para minha alma. Bálsamo no sentido de que vai ao encontro do que nós sempre defendemos. Assumir para redimir, isso está em Puebla N. 400. É preciso assumir essas culturas, assumir o rosto e sua diversidade e depois vamos falar em redenção.

Pe Modino – O papa Francisco, inclusive, tenta trazer imagens para mostrar que está muito perto do povo. Tem uma imagem, que até apareceu como capa do L'Osservatore Romano, em que ele abraça uma mulher negra brasileira que está participando da assembleia. Também apareceu tomando chimarrão e em fotos com todas as pessoas. Como isso influencia aqueles que estão participando da assembleia?
Paulo Suess – O chimarrão, provavelmente, já tomava na Argentina. Não precisava muito de inculturação (risos). Mas os outros são grandes elementos. O Papa é bom em dar sinais, que vão mais longe do que as palavras. Porém, nós sabemos que ele está numa estrutura ainda muito cristalizada e, para aquecer um pouco esses cristais, ainda não conseguiu tudo. E não pode fazer tudo como nós pensamos, como falamos nos corredores porque, se ele fizer isso, amanhã outro papa iria desfazer. Então, ele precisa também em tudo lutar internamente por um grande consenso para poder dar durabilidade para novos caminhos e para que não possam dizer que esse não é o caminho e parar tudo, levando para outra direção.

Pe Modino – Qual é sua expectativa para o “pós-sínodo”, o que espera que pode nascer dessa experiência sinodal?
Paulo Suess – Eu creio que o pós-sínodo vai ser como o Concílio Vaticano II. Vai haver momentos em que se esquece, momentos em que nos lembramos e vai haver, sobretudo, horizontes e processos iniciados e, mesmo se não der para concluir tudo no Sínodo, na admoestação apostólica que o Papa vai fazer no documento, marcará que os caminhos são abertos. E são abertos para, na região, nos sentarmos e pensarmos como vamos aplicar essa parte do Sínodo em nossa região, em nossa diocese.
Esse é o caminho sinodal, ele é mais complicado do que o caminho ditatorial ou imperial em que se decide. No Sínodo, se quer trabalhar na base do consenso. E consenso não da unanimidade, porém num grande consenso, o que leva tempo, tempo de conscientização da própria Igreja, dos nossos irmãos. E, ainda, vai depender da nomeação de bispos, da escolha de padres, vai depender muito da formação de padres, que se falou que não se faça em redomas, mas com processos participativos, com o povo, com a comunidade. Tudo isso leva tempo porque implica em mudanças culturais.






CANONIZAÇÃO DE IRMÃ DULCE




ROMA 13 DE OUTUBRO 2013

Paolo Cugini


Estou participando dos eventos paralelos que forma organizados para ajudar a refletir sobre o Sínodo da Amazônia, que está acontecendo em Roma. Cada evento tem seu próprio organizador. Todos os eventos públicos têm informações de contato, para que quem quiser possa entrar em contato para saber mais e se inscrever no evento. Alguns eventos são particulares e estão incluídos no calendário apenas por informação. Por esta razão, participei domingo 13 de outubro á solene canonização de ir Dulce, que se tornou a primeira santa nascida no Brasil, em Salvador da Bahia. Muitos baianos participaram do evento. Eu tive a possibilidade de encontrar pessoas de Andaraí e de Utinga na praça de são Pedro. 50 mil pessoas acompanharam a cerimônia. Também foram celebrados outros quatro novos santos: um cardeal inglês, uma freira italiana, uma freira indiana e uma catequista suíça.

Irmã Dulce nasceu em Salvador em 26 de maio de 1914 com o nome de Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes, ela desde muito cedo se envolveu com a religião e o cuidado dos mais necessitados. Com apenas 13 anos, já acolhia doentes e mendigos em sua casa. Adotou o nome de Irmã Dulce aos 19 anos em homenagem à sua mãe. Foi nessa época que ela entrou para a vida religiosa e passou a fazer parte das irmãs missionárias da Imaculada Conceição da Mãe de Deus.



 A partir daí, começou com vários trabalhos voltados à comunidade carente. Criou a associação obras sociais Irmã Dulce, com albergue e um centro educacional para abrigar meninos sem referência familiar. Esse centro funciona até hoje e atende 750 crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Ela também foi a responsável pela criação do Hospital Santo Antônio, um dos maiores da Bahia. O hospital surgiu quando a Irmã Dulce improvisou um abrigo para atender pacientes no galinheiro do convento. Hoje, o hospital realiza mais de 3 milhões de atendimentos pelo SUS por ano.

Toda essa dedicação fez com que ela chamasse a atenção do Papa João Paulo II, que a incentivou a dar continuidade aos seus trabalhos. Em sua segunda visita ao Brasil, o papa quebrou os protocolos apenas para visitar a Irmã Dulce, que já estava doente. Em 1988, ela chegou a ser indicada ao prêmio Nobel da Paz.

O Brasil verá Irmã Dulce na glória dos altares, como afirma o jornalista Juan Arias num artigo publicado domingo 13 de outubro no site IHU.UNISINOS, “em um momento quase de cruzada religiosa no país, onde a intolerância de alguns grupos de evangélicos extremistas perseguem outras religiões, sobretudo de origem africana. Irmã Dulce nasceu e atuou justamente na cidade com mais negros fora da África e a que melhor mantém suas tradições culturais e religiosas”.



A religiosa, intrépida e obcecada com os mais marginalizados da sociedade, dizia: “Meu partido é a pobreza”. Nunca teve escrúpulos em bater à porta dos políticos importantes do seu tempo, mas sempre para suplicar recursos para os mais abandonados, aos quais dedicou sua vida, e às obras por ela criadas exclusivamente para aliviar a dor e a pobreza.

Irmã Dulce, que como religiosa manteve sua visão moderna da mulher liberada que deve participar ativamente na vida pública, “é canonizada justo neste momento em que a reivindicação da mulher por seus direitos e peculiaridades, sem discriminações, representa uma das grandes batalhas no mundo e particularmente no Brasil, um dos países com maior número de feminicídios, e que vive um momento de machismo e obscurantismo cultural e religioso” (Juan Arias).




domingo, 29 de setembro de 2019

PAZ E SILÊNCIO







[Arquivo Miguel Calmon 2002]


Paolo Cugini


É assustador ver como os homens têm facilidade de pegar as armas para matar outros homens. É ainda mais espantoso quando isto é feito em nome de supostos princípios religiosos. Eu, de fato, acredito naquilo que Bin Laden, há alguns dias, vem dizendo por aí, ou seja  que a guerra dos Estados Unidos, além de manifestar um interesse para o petróleo iraquiano, representa também uma tentativa de contrastar o mundo islâmico.

A guerra é sempre feia, mas quando no meio aparecem motivos religiosos é ainda mais feia. Quem é que vai se lembrar da sensação decepcionante que provocou a chacina que aconteceu na Ruanda em 1994 quando duas tribos de religião católica, Utsi e Tutsi se massacraram para obter o poder político?

Pertencer a uma igreja ou a uma religião é uma coisa, interiorizar um conteúdo religioso é toda uma outra história. E assim nós temos igrejas lotadas de pessoas religiosas, que não sabem quase nada do conteúdo da religião que dizem pertencer. O resultado desse ateísmo religioso está aí, sobre os olhos de todo mundo. Quantas fofocas e brigas. Quantas pessoas religiosas não conseguem perdoar e dizer aquela palavrinha mágica: “desculpa”.

Interiorizar o Evangelho para que seja Jesus a guiar nossos passos, nosso pensamento: é o grande desafio.  Aceitar calar a boca e escutar. Parar de sair, entrar em si mesmo, é buscar o silêncio para aprender a discernir a voz do Mestre, para segui-lo.   
                                                                           

sábado, 21 de setembro de 2019

OS POBRES NÃO NOS DEIXARÃO DORMIR





[Arquivo Miguel Calmon 2004]
Paolo Cugini

Quem nasceu pobre, em um contexto pobre acha que a realidade é isto mesmo. Quem nasceu escravo nunca viu passar na cabeça dele de querer ser o patrão. Mesma coisa vale para o rico: ele pode até chegar a ter pena do pobre, más não vai querer trocar de jeito nenhum o seu lugar. O mundo é assim, cada um no seu cantinho.

É interessante observar como cada um deste dois mundos se organiza. O pobre vive o seu dia a dia se virando de qualquer jeito, tecendo uma rede de amigos e parentes que podem socorre-lo no momento de extrema necessidade. O pobre procura no rico um protetor, alguém que passa ajuda-lo de vez em quando. Os pobres sabem que, para eles, é impossível alcançar o patamar dos ricos. Por isto, vive tranquilo, se organizando e procurando sobreviver num nível baixo de vida. Aprender a viver com pouco e de pouco, ficar alegres e agradecer a Deus do pouco que consegue, ficar satisfeito de tudo aquilo que Deus cotidianamente doa: é esta a grande riqueza do pobre!

Pensar que uma família pobre cheia de filhos possa viver com o dinheiro que passa o governo, é loucura pura. Se o pobre não reclama, mas pelo contrário agradece a Deus pelo pouco que recebe, é porque aprendeu a arte da sobrevivência. Aprendeu a dormir no chão, a se curar de doenças com chá de ervas do mato, pois os remédios são caríssimos. Aprendeu a aceitar o frio nos meses de inverno e a fome nos dias onde não tem nada pra comer. O pobre aprendeu que, se ele não tem nada para cuidar da sua vida, da sua família não é porque Deus é injusto, mas porque o homem é mau.

É por isso que a paroquia deve seguir sempre mais de perto o caminho de Jesus, incentivando uma vida de partilha. A Igreja é aberta para ricos e pobres e, os ricos, escutando o evangelho, deveriam aprender a partilhar, pensando projetos sociais que visam ajudar os pobres, a aprender deles a viver com pouco.

BATISMO E COMUNIDADE



[Arquivo Miguel Calmon 2003]
Paolo Cugini



Pois todos fomos batizados num só Espírito para sermos um só corpo (1 Cor 12,13).

É assim que São Paulo escreve mostrando o sentido do Batismo, para os membros da comunidade de Corinto. O Espírito que recebemos no Batismo, além de ser instrumento de nossa salvação, nos impele a formarmos um só corpo.
Assim a Igreja torna-se o conjunto de todos os batizados que impelidos pelo Espírito Santo, esforçam-se para alcançar a comunhão. De que maneira?
Perdoando, partilhando aquilo que eles têm, solidarizando com os mais fracos, os mais carentes, comprometendo-se a realizar um mundo mais justo e fraterno. É por estes motivos que a nossa paróquia de Miguel Calmon, escutando as orientações da nossa Diocese de Rui Barbosa, sempre com mais força e determinação, caminhamos para que o Batismo volte a ser aquilo que era desde o começo do Cristianismo: a porta de entrada na Igreja. Infelizmente a falta de conhecimento da Palavra de um lado e, exigências pastorais do outro, produziram uma rachadura muito profunda no sentido original do Sacramento do Batismo. E assim, ao invés de ser o Sacramento que coloca uma pessoa dentro de uma comunidade cristã, o Batismo torna-se algo de autônomo, independente, como um objeto de uma loja que se possa até comprar.

De que forma nossa paróquia está ajudando os católicos para entrarem nesta nova mentalidade (que na realidade é bastante velha enquanto remonta às origens de nossa Igreja)? Em primeiro lugar, nestes últimos anos foram fortalecidas as comunidades de base não apenas na zona rural, quanto também na cidade. De fato, nasceram 17 novas comunidades na zona rural e 12 na cidade, além de manter acompanhamento pastoral naquelas que já existiam.   Fato interessante é que, além da equipe paroquial são também os ministros da Palavra e algumas das pastorais da nossa paróquia que estão ajudando no fortalecimento das Comunidades Eclesiais de Base. A Pastoral Familiar, da Juventude, do Dízimo, os Vicentinos nestes anos ajudaram em muitos encontros nas comunidades e encontraram sempre o entusiasmo do povo de Deus. Em segundo lugar, para ajudar as comunidades a desenvolver-se foi priorizado um trabalho de formação das lideranças que continuam também este ano.
Para ajudar a viver a ligação entre Sacramento do Batismo e Comunidades, nas últimas Assembléias foram tomadas algumas decisões. De agora em diante na Igreja Matriz o Batismo será celebrado uma vez por mês dentro da Missa das crianças e não mais em uma celebração separada. Foi preparado também um calendário onde foi marcada a celebração de Batismo em cada comunidade eclesial de base da cidade. A Pastoral do Batismo, ao invés de organizar cursos de Batismo centralizados, decidiu apoiar o trabalho Pastoral de base colocando-se a disposição das comunidades para visitar as famílias, com palestras nos bairros e celebrar a Palavra. Na zona rural os líderes das comunidades reunidas em Assembléia no mês de novembro, decidiram marcar um dia por ano para celebrar o Batismo em comunidades antecipando este dia com momentos específicos de celebrações.

é por estas razões que as assembleias paroquiais, em sintonia com as orientações Diocesanas, decidiram que para batizar uma criança os pais devem ser pessoas acostumadas a freqüentar a comunidade (pelo menos um dos dois). Isto vale também para os padrinhos. De fato, que sentido tem assumir a responsabilidade de ser padrinho ou madrinha de uma criança quando a minha ligação com a comunidade é fraca ou às vezes inexistente.?  Além disso sendo que o dever do padrinho e da madrinha é acompanhar espiritualmente através da oração e do testemunho pessoal à criança dentro da vida da comunidade eclesial, os padrinhos devem viver conforme os ensinamentos do Evangelho e da Igreja. Por esta razão podem ser padrinho e madrinha pessoas de dezesseis anos, ser batizados e que freqüentem a Igreja, e se estiverem juntos que sejam casados na Igreja.

No final, querido leitor, quero te dizer uma coisa: não busque a Igreja só para pedir coisas – comida, cesta básica, sacramentos como se a Igreja fosse uma loja qualquer. Busque a Deus para uma vida mais digna. Se fizer isto sem dúvida você descobrirá a Igreja como uma comunidade de irmãos e irmãs que, apesar dos limites, esforçam-se para realizar o reino de Deus.

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

ORAÇÃO A NOSSA SENHORA



Festa da Padroeira de Miguel Calmon

8 dezembro 2003

Paolo Cugini

 

O Maria Mãe de Deus

Daí a nós, fracos na fé, a força e a coragem de testemunhar em cada momento de nossa vida, o amor a Teu Filho Jesus, numa vida de Comunhão intacta. Na busca constante do bem do outro, do nosso irmão, da nossa irmã.

O Maria Mãe de Jesus

Proteja as crianças, os adolescentes, os jovens da nossa cidade, de nosso município, para que possam crescer saudáveis, com oportunidade para estudar, trabalhar para realizarem o plano de Deus de uma vida digna.
Proteja e ampare as nossas famílias para que de tornem, no exemplo da Sagrada Família, lugares onde se aprende a amar, a respeitar e crescer no domínio de se mesmo.

Protege também, nossa querida Mãe, as pessoas idosas, libera elas da solidão incentivando a solidariedade, a amizade entre vós.

O Maria nossa Mãe, ajuda os doentes a viver o sofrimento momentâneo, unido-o ao sofrimento de teu filho Jesus, que sofreu e padeceu por nós, porem nos liberta dos nossos pecados.

O Maria Rainha da Paz, afaste a violência de nossa cidade, tocai nos corações das pessoas para que se afastem dos caminhos dos vícios recuperando a própria dignidade humana.

O Maria Sede de Sabedoria, daí inteligência aos nossos governantes, para que no próximo ano não desperdiçam o tempo para se encobertar, mas para apresentarem projetos políticos visando o melhoramento da nossa cidade, com atenção aos mais pobres e excluídos, apresentando projetos concretos para gerar emprego, melhorar as condições de vida.

O Maria, Mãe da Igreja, abençoa as nossas comunidades, para que se tornem sempre mais comprometidas com a participação da construção de uma sociedade justa e solidaria

Amém


Fé e Vida





ARQUIVO
[Miguel Calmon, 2001]

Paolo Cugini


Se a visão cristã leva a olhar para o “novo céu e a nova terra” (Ap 21,1) isso não enfraquece, antes estimula o nosso sentido de responsabilidade pela terra presente (João Paulo II). São palavras do Papa que salientam a ligação entre fé e vida, amor a Deus, amor e fidelidade a terra. São palavras que apelam à nossa responsabilidade para com a criação. Isto quer dizer que, quanto mais amamos a Deus e buscamos a sua proteção, tanto mais esta busca deveria nos levar para um compromisso mais firme para com a justiça, a paz, a saúde e em uma palavra: a cidadania.

 Nem precisaria falar disso porque em Jesus encontramos o exemplo. De fato, o Filho de Deus comprometeu-se com a vida, a justiça, a exclusão social. A compaixão que ele manifestou em várias ocasiões para com os mais pobres que, a seu ver, eram “como ovelhas sem pastor” era fruto do relacionamento íntimo que Jesus tinha com seu Pai.

Estou aqui escrevendo sobre isso porque entre nós católicos espalhou-se uma doença espiritual que se manifesta em duas formas opostas, mas que brota da mesma raiz: a separação entre fé e vida. De fato, de um lado encontramos aqueles que acham que a vida de fé se resolve dentro das paredes da igreja, e aí vem o esforço para uma liturgia super organizada, esbanjando dinheiro com flores, cortinas, acessórios litúrgicos.  Quanto mais se gasta nestas coisas, tanto mais Deus e os santos gostam (assim acham eles).

 De outro lado encontramos os católicos comprometidos com as causas sociais: a terra, a água, as lutas políticas. Com estes católicos é melhor não falar de sacramentos, de Eucaristia, menos ainda de liturgia: arregalam os olhos como se tivesse o bicho da meia noite na frente.

Se quisermos curar esta doença espiritual, o melhor remédio é olharmos com mais intensidade o rosto de Cristo. Jamais encontraremos nele os sintomas desta doença, que afeta milhares de católicos no mundo todo. Em Jesus poderemos contemplar o Cordeiro de Deus que, enquanto celebra pela última vez o rito pascal com os seus discípulos, profetiza a própria morte como o coroamento de uma vida totalmente doada. Em Jesus fé e vida nunca são separadas.


quarta-feira, 31 de julho de 2019

LEITURA POPULAR DA BÍBLIA



VERONA (ITALIA) 30 JULHO-4 AGOSTO 2019

UMA CAMINHADA ECO-MISTICA-POLITICA

Anna Maria Rizzante Gallazzi 

Síntese: Paolo Cugini

Mt 11,25 Oh Pai te agradeço pois revelou estas coisas aos pequenos e a escondeu aos sábios

A LPB a encontramos nos pequenos, os humildes. Para entender a Palavra precisamos nos coloca juntos dos pequenos. A LPB é um lugar, a terra dos pobres. Deus tomou parte, a parte dos pobres, que o ponto de partida da LPB. A consequência é o conflito, e quando acontece precisa decidir de que lado ficar. Deu por primeiro fez esta escolha. Deus esconde a verdade aos sábios. É deste jeito que Deus gosta.
Infelizmente a Igreja Católica trabalhou no meio dos sábios, esquecendo os pobres. Uma leitura popular é dizer de que lado nos colocamos.

O coração e a mente dependem aonde os pés pisam. Não pode existir uma espiritualidade que não seja militante. A espiritualidade deve nos ajudar a sermos militantes. A nossa ação depende aonde os nossos pés estão. Esta militância chega á ecologia, uma palavra que não existe na Bíblia. A ecologia é uma reflexão sobre o ambiente.

Ecologia: casa. De que casa estamos falando? Na Bíblia tem muitas casas com diferentes formas. Em casa nós estamos? Existe uma casa aonde a gente deve sair, como o Egito. A palavra farão quer dizer casa grande. Em que casa queremos entrar e contra quais casas queremos lutar? As vezes existe uma não casa, que é o corpo de uma pessoa.
Deus quer que as pessoas se incomodam para sentir de uma forma diferente.

História dos patriarcas. Descobrir aquilo que não foi dito, é muito interessante. No livro de Genesis capitulo 16 e 20 existe a história de Agar, que morava na tenda de Sara e Abrão. Estamos na época do nomadismo. Nesta tenda existem problemas. Sara não tem filhos. E então Abrão toma uma empregada, uma escrava, que podia ser utilizada para o dono e deita com ela para ter um filho. Depois disso Sara se queixa e Abrão entrega Agar á Sara. Agar no capitulo 16 que foge com a criança na barriga e no capitulo 20 a criança já tinha nascido. Porque esta diferença? Talvez porque estes capítulos vêm de tradições diferentes. As contradições na Bíblia devem nos atrair, pois é aí mesmo que tem um mistério que deve ser compreendido. Talvez esta Agar narra a história de um nós coletivo. Esta é uma leitura a partir dos empobrecidos, que muda profundamente a interpretação. Nunca saberemos a verdadeira história de Agar. Existe uma diferença entre história verdadeira e a verdade da história.
 Nunca saberemos da verdadeira história. Agar foi mandada embora e quem olha pra ela? O anjo do Senhor. É Agar que recebe a visita do Senhor no capitulo 16 e não Abrão. Este dato é muito importante. Agar recebe a mesma promessa de Abrão antes dele. Aqui temos o começo de uma dinastia. Não somos acostumados a parar sobre a figura de Agar, pois a nossa mentalidade machista e patriarcal vá logo a olhar a figura de Abrão. Deus escutou o grito de Agar, uma estrangeira. Só depois será a vez de Sara e Abraão. A memoria de Agar nunca foi cancelada, isso quer dizer que é muito forte. Deus revela as coisas aos pequenos. É Agar que dá o nome ao filho, é uma grande novidade.

Genesis capitulo 21: Agar é mandada embora, se perdeu e fica sem nada. Quando alguém chega ao fim algo acontece. Deus escuta o grito do filho de Agar. Deus não deixa ninguém à toa. Deus escuta o lamento do pobre. No capítulo 16 Agar dá o nome ao filho e no capitulo 21 Agar dá de beber ao filho. A mística da mão estendida é típica de Deus. Tomar conta de um poço era a atitude do chefe de uma tribo no deserto. Aqui, pelo contrário, é uma mulher a fazer isso. Além disso Agar indica a esposa para o filho. Também esta atitude era do homem.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

O PROFETISMO DOS POBRES







ARQUIVO
 Miquel Calmon, dezembro 2003


Paolo Cugini

“Os pobres estarão sempre conosco”, nos diz Jesus. Também porque sempre existirão pessoas egoístas que farão de tudo para acumular para si, sem importar-se do sofrimento daqueles que não têm.

Como é que pessoas tornam-se tão insensíveis para não ouvirem o grito desesperado dos famintos, sedentos, excluídos? É simples: é só olhar do outro lado; é só pensar em si mesmo; é só encher a cabeça dos próprios problemas. Jesus curava os doentes, saciava os famintos e apontava para eles o caminho da vida. Isso quer dizer que se por um lado não basta dar de comer aos pobres sem oferecer um caminho de saída, é também verdade que a Palavra de Deus semeada no meio dos pobres precisa de um ato concreto de caridade. Esta é a tarefa da Igreja: anunciar a Palavra de Deus e, iluminada pelo Espírito Santo, encontrar formas concretas para ajudar os pobres, os excluídos a se levantarem. A Igreja é tal se a sua palavra convida os pobres a ficarem no centro dela, assim como fazia Jesus “disse ao homem da mão seca: levanta-se e fique no meio” (Mc. 3,3).

Na comunidade o pobre deveria sentir-se respeitado, acolhido e aceitado por aquele que é: filho, filha de Deus. Resgatar a dignidade dos pobres é a difícil tarefa da Igreja. É difícil porque hoje são os pobres mesmos a se desrespeitarem. Acostumados há séculos a serem pagos para não fazerem nada, o pobre percebe a dificuldade de um trabalho continuativo. Dezenas de anos de cestas básicas, bolsas escolas, projetos governamentais, que dão de graça comida e dinheiro, acostumaram os pobres na moleza pura. Aqueles que são chamados projetos sociais, na verdade são projetos que produzem massas anônimas, dependentes de tudo: são projetos imorais que ferem a dignidade das pessoas.

Porque o poder continua dessa forma, dando migalhas de graça aos pobres, deixando multidões de pessoas no total abandono?

A resposta está na dura realidade. Os que querem manter o poder precisam disso, precisam de multidões de miseráveis para si manter. É triste, mas é assim mesmo. Quem tem o poder, apesar das palavras mirabolantes, não tem nenhum interesse a resolver os problemas dos pobres de uma forma contundente. É melhor manter milhões de pessoas na total dependência, que ajudar as pessoas a se tornarem protagonistas da própria vida. Um pobre que pensa é um perigo: melhor mantê-lo na forma da dependência total, jogando algumas migalhas de vez em quando e ser, assim, agradecido. A Igreja é profética quando vive neste mundo do lado que Cristo escolheu: os pobres. É importante também dizer que esta escolha deve ser feita de uma forma inteligente e não superficial. Prudência e esperteza são virtudes evangélicas.

 Não adianta, então, levantar a bandeira dos excluídos só para aparecer.  A história da Igreja é infelizmente cheia dessas coisas. O caminho é lento e está nas mãos de Deus. Por aqueles que pelo amor a Cristo se deixaram atrair por esse caminho, que é o caminho da cruz, é suficiente saber que somos servos inúteis, mas servos de Cristo. 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Pastoral da juventude: algumas reflexões

ARQUIVO (CAMINHAR JUNTOS-Miguel Camon-BA, 2004)








Paolo Cugini

Que o objetivo da Pastoral da Juventude seja anunciar o Evangelho aos jovens, acho que ninguém possa questionar. O problema é no método, ou seja, como é que se evangeliza a juventude hoje. Esta pergunta revela que não podemos anunciar o evangelho a todos os jovens que encontramos do mesmo jeito. Com os jovens que vivem na zona rural, por exemplo, precisa de um trabalho diferente daquele  que se faz com os  que vivem na cidade.

O evangelho exige ser encarnado, inculturado, ou seja, deve ter o mesmo cheiro,  o mesmo sabor do povo que se pretende evangelizar. Em todas as paróquias da nossa Diocese de Ruy Barbosa encontram-se jovens nos bairros, nas escolas, no campo, jovens de classe média e jovens de classe pobre (a maioria); jovens brancos, pretos, pardos, índios, ciganos. É antievangélico apresentar o mesmo estilo, o mesmo jeito, a mesma proposta a toda esta realidade diversificada de jovens. A maneira de anunciar o evangelho deve ser inventada dia-a-dia com os jovens que participam daquele grupo, naquele lugar específico.

O coordenador de um grupo jovem é craque quando sabe fazer isto. É claro que para ter esta capacidade criativa, deve ter dentro de si o desejo de anunciar Jesus aos jovens e, por fazer isto deve ter encontrado Cristo na própria vida. Jesus Cristo, de fato, aconselhava, orientava os seus discípulos e, sobretudo, ajudava a enxergar a realidade com olhos diferentes. Jesus comunicava aos discípulos a própria experiência pessoal de Deus.

 É nessa altura que convido os coordenadores dos próprios jovens a participarem da proposta formativa da paróquia feita de encontros, retiros, estudos bíblicos e, sobretudo a Santa Missa de domingo.
Quem não fixa os olhos em Cristo, quem não ama a Cristo, ao em vez de levar os jovens a Ele, os leva por outros caminhos. Se não tivermos em nós um coração cheio de amor de Cristo iremos explorar os próprios jovens para satisfazer as nossas misérias humanas. E assim o grupo ao em vez de ficar aberto aos outros jovens e inventar eventos para chamar e atrair outros jovens no grupo, este mesmo se transforma numa panelinha de poucos amiguinhos e bem fechadinhos. Que tristeza!

Segundo elemento importante na caminhada de evangelização da juventude é a comunidade. Não existe possibilidade nenhuma de ser grupo jovem e não ser pessoas bem engajadas na comunidade, na Igreja. De fato, se o objetivo da pastoral da juventude é, como vimos, anunciar Jesus, então Cristo encontra-se presente no seu corpo que é a Igreja.

Nos grupos jovens enfrentam-se os problemas da realidade corriqueira tentando  resolvê-los a luz da fé, do evangelho, na vivência da comunidade. Isto quer dizer que a vida da comunidade torna-se o ambiente vital do grupo jovem, pois é na comunidade que encontra o clima espiritual e existencial para crescer. Quanto mais a comunidade é organizada e ativa tanto mais se torna ponto referencial para os jovens. Em Miguel Calmon, (isto acontece em várias comunidades) os grupos jovens mais fortes e ativos encontram-se nas comunidades mais organizadas,  vivas e ativas.



terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

“Entre nós não deve ser assim” Reflexão sobre as recentes eleições municipais


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Paolo Cugini

As eleições municipais terminaram; graças a Deus! Ninguém   estava mais agüentando a confusão, os carros de som, as músicas (de péssimas qualidade) dos candidatos. Nas próximas eleições iremos exigir mais atenção contra a poluição sonora. Foi muita falta de respeito, muita falta de educação cívica. Os cidadãos têm direito para serem respeitados, também no período eleitoral.

Nesse contexto o Movimento Fé e Política fez a própria parte. Desde o começo, o movimento apontou a direção da própria ação; conscientizar o povo sobre os direitos e deveres dos eleitores, sobre a importância do voto para o bom desenvolvimento da democracia, explicando,   aonde foi possível, as exigências da lei 9.840, contra a corrupção eleitoral. No primeiro programa que o Movimento Fé e Política realizou pela Rádio Comunitária Canabrava FM, foi salientado que a mudança de mentalidade do eleitor e do candidato era  uma conquista civil  impossível para ser alcançada no breve período. Foi com esta consciência, que entramos na campanha política de uma forma alegre e tranqüila. Realizamos vários eventos de conscientização, utilizando métodos diferentes, avaliando semanalmente o nosso trabalho. Foi uma semente que queremos, de agora em diante, cultivar para que a consciência democrática de nossa cidade, possa crescer sempre mais.

Na homilia do último dia do ano passado alertei os católicos sobre as eleições políticas deste ano, dizendo que teriam sido uma avaliação da nossa maturidade espiritual. Interiorizar a Palavra de Deus é viver esta Palavra na vida do dia-a-dia. A Palavra de Jesus é uma Palavra profética de denúncia contra as injustiças sociais, contra as hipocrisias. Além disso, é uma Palavra de amor, de conversão, de perdão. Um cristão que participa da mesa eucarística do domingo, não pode considerar o irmão, que participa da mesma mesa, um inimigo, pelo simples fato que vota num candidato diferente. Infelizmente isso aconteceu. Várias pessoas começaram tratar o irmão de forma diferente, como um inimigo, pelo simples fato de que votava num outro candidato. Interiorizar a Palavra de Deus e o seu Espírito leva as pessoas ao respeito da liberdade do voto. É Jesus mesmo que fala: “Entre nós não deve ser assim: mas quem quiser ser o primeiro seja o último”.
O respeito da liberdade do outro, do pensamento do outro, da possibilidade do outro agir e pensar de uma forma diferente da minha, não é apenas uma conquista de vida espiritual, mas também é uma atitude democrática. A existência de uma oposição na cidade é uma bênção pelo andamento democrático. É absurdo querer que todo mundo pense do mesmo jeito. É absurdo, antidemocrático e desumano. O espírito democrático fortalece na pluralidade de opiniões, na comunhão da diversidade e não na uniformidade.

Somente cultivando esta diversidade, este espaço democrático da pluralidade de opiniões, poderemos evitar o risco do totalitarismo. De fato, na história os regimes totalitários- fascismo, nazismo, comunismo- se mantiveram ao poder com o controle das massas. O pensamento único não existe, a não ser na cabeça de alguém, que quer viver em paz e, para isso, obriga  todos a pensarem como ele.
 Os grandes derrotados destas eleições foram os pobres. Esquecidos nestes anos, foram  visitados de uma forma maciça nestes últimos três meses.“Ali vem o outro”. Parecia brincadeira, a procissão corriqueira dos candidatos caçando votos. Porque os candidatos não foram da mesma forma insistentes nas casas dos comerciantes, dos professores, dos moradores das ruas  do centro?
Mais uma vez o pobre foi considerado como simples mercadoria, possível a ser comprado, também a preço baixo. O pobre sabe que não tem voz nem vez: deve aceitar tudo. Forçado a escutar projetos mirabolantes até com palavras dificílimas (“Padre, quer dizer esta palavra, que o fulano de tal usou para dizer o que vai fazer?”), o pobre abre a porta pra todo mundo. O pobre é assim considerado como prostituta, que abre a porta de casa a todos aqueles que oferecerem dinheiro. Para considerar os pobres como filhos e filhas de Deus, com uma dignidade, Miguel Calmon, deve amadurecer muito. Ao meu ver o futuro de Miguel Calmon não está na frente, mas atrás.

Explico-me. Pessoalmente acredito muito no trabalho de base que está sendo desenvolvido nas comunidades de base, seja na zona rural que na sede.
Se tivermos a paciência de regar cada dia a semente  que está sendo plantada, sem dúvidas colheremos frutos. Os homens novos que Miguel Calmon precisa, ainda não chegaram, ainda não são formados. Mas chegarão. Os homens novos que Miguel Calmon precisa são aqueles que falam de Deus, agem e pensam como Ele. Nos comícios que assisti, vários candidatos falavam de Deus e de Maria e depois lançavam palavras de ódio contra os adversários. É esta a hipocrisia que deve ser tirada do meio. Isso é possível. Através de um caminho de conversão, de mudança de atitude, mudança que somente o Espírito do Senhor pode realizar. Por isto digo que o futuro de Miguel Calmon está por trás. Está naqueles adolescentes e jovens apaixonados pelo Senhor, que estão dedicando horas de joelho por Ele, meditando a sua Palavra.
O homem novo não nasce de um dia para o outro. É um longo caminho, silencioso, escondido. Até que um dia...