Paolo Cugini
Quais
são os aspetos, os setores da teologia e da realidade eclesial que se tornaram
espaços de contaminação e quais são as contaminações mais significativas? Em
outras palavras, o que está a contaminar a Igreja, que temas, problemáticas e
processos culturais estão a forçar o tecido eclesial a abrir-se ao confronto, a
deixar-se contaminar? São estas
as perguntas que procuram conduzir à vivência quotidiana, à realidade, para não
permanecer sempre no plano teórico, mas mostrar como aquilo que analisámos não
só tem consequências na vida das pessoas, mas já está em curso. A cultura
do “depois”, que traz como marca visível o prefixo “pós”, rompeu barreiras que
pareciam indestrutíveis e, deste modo, abriu e está a abrir novas brechas no
pensamento, novas possibilidades existenciais e espirituais. Na minha opinião,
é impossível permanecer imune a este processo, cada vez mais avassalador, em
todos os níveis da cultura. Também a Igreja, portanto, não se pode dar ao luxo,
e sobretudo ao risco, de se fechar em si mesma, continuando a lutar sozinha
contra moinhos de vento, porque esse mundo contra o qual lutava já não existe;
e se não se apercebe disso, alguém tem de lho dizer: sem ofensa, mas por amor.
Em
primeiro lugar, convém esclarecer logo que, como defendia Thomas Kuhn, que
elaborou o conceito epistemológico de paradigma, apesar das mudanças
paradigmáticas, os sujeitos envolvidos não mudam de postura de um dia para o
outro. Em outras palavras, não podemos esperar de uma instituição como a
Igreja, que há séculos defende com unhas e dentes as suas verdades dogmáticas,
que se torne imediatamente disponível para a contaminação: seria exigir o
absurdo. Creio que, nesta primeira fase, é importante abrir brechas culturais
sobre as quais seja possível estabelecer um diálogo aberto e sincero. O facto
que emerge neste novo contexto é que já não é possível permanecer
entrincheirado nas próprias posições. A Igreja tem um património espiritual,
cultural e artístico imenso, que pode, a qualquer momento, colocar nas mesas de
diálogo, com um estilo aberto, disponível, sem condenar ninguém, mas mostrando
a capacidade de valorizar cada contributo cultural. Há tanta beleza fora dos
recintos eclesiais, há imensa espiritualidade que vale a pena conhecer e
reconhecer, há caminhos culturais que merecem toda a nossa atenção, mesmo que
venham de longe e, à primeira vista, pareçam não ter nada a ver connosco. Tudo
está ligado a tudo e nada fica fora desta intuição.
Há outro ponto importante a sublinhar. Se é verdade que a nível da hierarquia levará muito tempo até que esta se torne sensível às contaminações e se deixe contaminar, ao nível da base este processo de contaminação já está em curso há muito tempo. Quem vive o Evangelho no quotidiano da comunidade local raramente se preocupa com a ortodoxia das suas escolhas e afirmações. Quem vive no mundo do trabalho, da escola, no mercado, nas ruas ou nas praças respira diariamente um ar novo, entra em contacto com mundos diferentes, que influenciam o pensamento, as escolhas, o comportamento. Ao nível da base, a ortopraxia conta mais do que a ortodoxia. Além disso, é bom recordar o fluxo de contaminações que acontecem a toda a hora nas muitas plataformas de internet. Se é impossível defender-se, também porque não faz sentido, o esforço que deve ser feito é o de oferecer instrumentos tanto de acesso a estes novos mundos culturais e espirituais, como de interpretação. Nem tudo o que encontramos nas praças é bom e merece ser assimilado. Como proceder e que percurso seguir para ser capaz de captar o belo no mundo e ajudar outros no mesmo caminho? Quais são aquelas contaminações que já nos contaminam positivamente, mesmo sem darmos conta?
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