quinta-feira, 17 de junho de 2021

OS OBSTÁCULOS DA VIDA




Paolo Cugini


 Estamos muito acostumados a querer imediatamente o que procuramos , a exigi-lo, por isso parece-nos absurdo esperar. Somos muito estimulados pela nossa cultura a identificar o bem com o imediato, que custa nos situar num horizonte de espera. Estamos tão acostumados a fugir rapidamente de nós mesmos, que não podemos nos dar ao luxo de parar para nos ouvir. E, assim, com o tempo, amontoam-se dentro de nós entulhos existenciais, que teriam requerido alguma atenção e que, ao invés, não tendo nos encontrado a escuta, jazem dentro de nós, pressionando a nossa consciência em busca de respostas que não encontram. 

Estamos acostumados: esse é o problema. Aprendemos a reclinar desde cedo naquilo que achamos confortável, e aprendemos com outras pessoas acostumadas, deitadas nos sofás da vida, pessoas que aprenderam a identificar a tranquilidade com o sentido da vida e aprenderam isso com outros sossegados, pessoas serenas, que aprenderam a viver evitando problemas, evitando obstáculos. No entanto, os obstáculos existem de propósito não para evitá-los, mas para enfrentá-los. Foi Ele, o Senhor da vida, quem inventou os obstáculos, para que cresça quem os encontra, aprendendo a enfrentar estes benditos, diria mesmo sacrossantos obstáculos. Porque, meu amigo querido, é precisamente enfrentando os obstáculos que aprendemos a viver, porque a vida não se aprende na escola, mas enfrentando os problemas todos os dias. A vida não está escrita em livros, mas nós a escrevemos quando vivemos em plenitude, enfrentando os obstáculos que a vida nos coloca.

E tem mães que se levantam de madrugada para se certificar de que os pequenos estão com tudo pronto, que não têm que fazer nenhum esforço, que têm o único problema de enfrentar o dia sem cansaço, sem ter que enfrentar obstáculos porque mamãe já pensou neles. E então, você encontra aquelas crianças de quarenta anos que, apesar de seus músculos e barbas, permaneceram crianças, incapazes de enfrentar a vida, cheias de medos, porque em vez de enfrentarem obstáculos sempre encontraram uma mãe, que os tirou antes que eles os vissem. Pobres desgraçados! Que pena esses homens sem um pingo de bom senso! Que pena esses covardes, esses acovardados, continuamente exigindo da vida, sempre prontos para reclamar de tudo e de todos. Porque, a essa altura sabemos, que quem reclama, quem se levanta de manhã e antes mesmo de dar bom-dia está pronto para reclamar, vem daquele estoque, vem daquele povo de gente que teve uma mãe mimada que estragou eles e, desta forma os tornou insuportáveis.

 Sem dúvida, Maria foi uma mãe diferente. Certamente Jesus enfrentou os obstáculos desde criança. Podemos dizer isso pelo tipo de homem que ele se tornou. Jesus nunca teria alcançado a cruz se não tivesse aprendido a dizer a verdade e a suportar o impacto das consequências. Ele nunca teria ressuscitado se não tivesse morrido na cruz por ter amado os seus de maneira gratuita e desinteressada até o fim. Que homem Jesus! Que mãe ótima ele tinha! 

 

 

quinta-feira, 3 de junho de 2021

25 ANOS DE PADRE, APESAR DE TUDO

 


Hoje, comemoro 25 anos de vida no ministério sacerdotal. Seria 26, mas no ano passado fiz uma pausa e depois conto 25.

Na foto que coloquei, pareço um cara normal, tranquilo, um padre como tantos outros. Na verdade não foi bem assim, pelo menos a história me preparou para alguns encontros, experiências, acontecimentos que mudaram minha visão de mundo, minha percepção pessoal de Deus.

Estes anos foram para mim um caminho de lenta libertação de todas as formas de religião, entendida como um conjunto de elementos que procuram segurar Deus, através de doutrinas, dogmas, ritos, para encontrar Jesus que veio ao meu encontro.

Encontrei Jesus e ainda o encontro em ambientes estranhos ao mundo religioso.

Te encontrei, Senhor, nos jovens que, nos primeiros anos de ministério, encontrei nos bares, nos parques. Jovens que nunca frequentaram a igreja, mas demonstraram grande espiritualidade.

Te encontrei nas pessoas dos bairros pobres onde morei quinze anos no Brasil. Bairros esquecidos pelo governo, mas também pela Igreja. Pessoas excluídas da possibilidade de ter um trabalho decente, uma casa decente, uma vida decente. Excluída e, por isso mesmo, amada de um jeito muito especial do Senhor. Quanta presença de Deus senti nesses excluídos.

Eu te encontrei e continuo a encontrar-te em tantas mulheres que, de certa forma, me fizeram lembrar de pertencer a uma instituição de forte caráter patriarcal e misógeno. Mulheres que lideram comunidades com muito amor e competência, mas que não têm o direito de participar na hierarquia, nos órgãos de decisão da Igreja. É muito injusto tudo isso, mas o Deus de Jesus Cristo está do lado dos injustiçados, dos perseguidos.

Ultimamente te encontrei nas lésbicas, nos homossexuais massacrados não só pela cultura arrogante dos ignorantes, mas também por aquela Igreja da qual sou representante. Quanto sofrimento ouvi nesses cristãos, que as pessoas nas paróquias não queriam que eles orassem na igreja. Que falta de amor, de misericórdia: que humilhação! Só ficando perto deles é que percebi a tua presença misteriosa, que está sempre do lado dos perseguidos, dos marginalizados.

E agora, por tantos motivos que não vale a pena escrever, vivo no exílio, nos confins de uma diocese, como um estrangeiro. Do ponto de vista humano, minha trajetória nestes anos seria lida exatamente como uma derrota, um fracasso total. Pelo contrário, olhando esta mesma história do lado de Cristo, com o olhar que vem do Evangelho, sinto todo o carinho de Jesus, o seu amor, a sua misericórdia.

Continue orando por mim, eu sempre oro por todos vocês.