domingo, 26 de abril de 2020

JUVENTUDE E ACOMPANHAMENTO ESPIRITUAL






Paolo Cugini

Uma característica ligada à problemática da juventude gira em redor do problema do sentido da vida. Todo jovem vive a angustia do próprio futuro, daquilo que será dele, do trabalho que irá arrumar e assim em diante. Muitas vezes a angústia do futuro leva o jovem para caminhos errados. É difícil, de fato, agüentar o peso da insegurança, sobretudo quando é encaixada numa situação econômica e social carente. Ser jovem, apesar das aparências e dos mitos que consideram a juventude a idade da alegria, da falta de compromisso, não é fácil.  O jovem percebe a cada dia a responsabilidade de tomar as decisões justas para que a própria vida possa enveredar o caminho certo. Aonde arrumar o dinheiro para entrar no cursinho que prepara para o vestibular? E depois, passado o vestibular, como manter os próprios estudos? Seria melhor arrumar um trabalho sem carteira assinada, ou esperar e correr atrás de algo mais seguro? E que preço seria disposto a pagar para uma segurança econômica? Um dos trabalhos mais seguro é sem dúvida aquilo que se encontra nas prefeituras. Muitas vezes, porém, entrar no orgânico da prefeitura significa calar a boca, não ter mais a possibilidade de denunciar as situações de injustiça, corrupção que acontecem á luz do sol. Vale a pena perder a própria liberdade em troca de uma segurança econômica que, muitas vezes, é mixaria pura? Problemas em cima de problemas; quem ajuda os jovens a resolvê-los? É claro que cada um é responsável da própria vida, mas é possível ajudar um jovem nesta fase tão delicada da sua vida?  

A primeira forma para ajudar um jovem nesta fase tão delicada da vida é, sem dúvida nenhuma, o diálogo. Só que, logo que um adulto se aproxima ao jovem para tentar abrir um espaço, ali encontra uma parede chamada desconfiança. Por toda uma série de fatores, o jovem é naturalmente desconfiado para com o adulto. É preciso, então, se armar de santa paciência e começar a subida da “montanha” da confiança. Trata-se, de fato, de uma verdadeira conquista, feita de etapas, de derrotas, de contínuo esforço para conseguir uma brecha na amizade da juventude. É claro que aquilo que aqui se entende, não é a simples conversa, ou a brincadeira alegre e descontraída.  Dialogar com um jovem para ajudá-lo a enfrentar os problemas da vida, significa entrar no mundo delicado da vida interior. Além disso, a grande dificuldade que se encontra neste caminho, é que dificilmente o jovem na infância e na adolescência foi ajudado a descobrir e a lidar com a própria interioridade.  Isso vale, sobretudo, nos lugares aonde, muitas famílias são envolvidas na busca cotidiana dos elementos básicos para viver ou, em muitos casos, para sobreviver e, para quem deve enfrentar estes problemas, não sobra muito tempo para cuidar da reflexão e da vida interior.  Por isso quando um adulto se aproxima do jovem para tentar ajudá-lo a viver com mais serenidade os problemas da vida, encontra logo a desconfiança e medo de escutar aquilo que sente dentro de si e que amiúde abafa por não querer sofrer.  

Nessa altura dá pra entender que, acompanhar a espiritualmente um jovem, não é apenas ensinar a rezar, a meditar a Palavra de Deus, mas fazer com que a oração e a Palavra possa iluminar e penetrar  a sua vida, influenciar as suas decisões, preencher de sentido os seus atos. Sem dúvida, não é qualquer pessoa que pode fazer isso. Somente quem já passou a própria juventude lidando com a própria vida interior e se esforçando na vida adulta a moldar a própria existência no Evangelho, pode ajudar alguém neste caminho. Seria bom encontrar nas paróquias pessoas disponíveis por este trabalho tão importante e, ao mesmo tempo, tão delicado.


sexta-feira, 10 de abril de 2020

SÁBADO SANTO: O SILÊNCIO DE UM DIA TERRÍVEL





Paolo Cugini


Devemos ter a coragem de ouvi-lo, sem subterfúgios, sem enche-lo de significados, sem querer adoçá-lo a todo custo. Não podemos adoçar o que não é doce, não pode sorrir no dia mais triste do ano: Sábado Santo. O que, então, tem de santo esse dia horrendo eu nunca entendi. De fato, como podemos chamar o dia mais vazio de todos, de santo o dia do absurdo absoluto, o dia em que toda a humanidade ficou sem fôlego, com o respiro suspenso? Porque, na realidade, toda a humanidade naquele dia se levantou sem saber para quem orar, sem poder orar a nenhum Deus, porque Deus havia morrido no dia anterior, assassinado barbaramente.  Nem sempre podemos fingir, sem querer ver, sem querer ouvir. Não temos mulheres como Maria Madalena, que sabem chorar pelo seu mestre morto, que sabem sofrer intensamente sem fingir, sem esconder nada: isso é amor. Aquele amor que flui do coração e não do cálculo, esse amor que é pura paixão e não racionalidade controlada, que calcula, que sabe fazer cálculos mesmo com sentimentos. E não podemos fingir e correr imediatamente no domingo, não podemos passar por este dia terrível, o sábado santo, porque temos medo do escuro e fingir que nada aconteceu; não podemos cobrir os olhos e os ouvidos para ir diretamente para a manhã de domingo. Acima de tudo, porém, não podemos antecipar o domingo de ressurreição ao sábado de manhã, como infelizmente acontece com frequência e de bom grado em certas igrejas, que começam preparar as decorações de domingo, como se o sábado do grande silêncio não existisse. Que desrespeito!

É preciso o silêncio para escutar o nada, entender o que seria o mundo sem significado, ou seja, sem Deus. O vazio deve poder penetrar no coração do homem e na consciência da mulher pelo menos uma vez na vida, para ter, então, a possibilidade de avaliar todas as ideologias que nada mais são do que vazios disfarçados de sentidos, nas quais nos apegamos para não morrer de asfixia. Forçados a inventar significados, quando é possível perceber que não há sentido, que estamos subindo nos espelhos, que estamos conversando ao vento e que não temos coragem de ficar calados por medo de sentir o vazio, de sermos penetrados pelo nada. Este é o significado do Sábado Santo, que é santo por esse motivo, porque nos permite tocar as cinzas da nossa vida, o nada dos nossos projetos sem Deus.

Pendurar-se no vazio, pelo menos uma vez na vida, pode ser de grande ajuda para entender a quem e ao que estamos amarrando a nossa vida, a quem estamos entregando a nossa existência, esforçando-se, pelo menos uma vez na vida, de não mentir pra nós mesmos. Mergulhamos todos os dias em rios de palavras inúteis para embelezar o que é feio por natureza, o que sai mal de nós, que não tem forma, porque não pode ter nenhuma forma, pelo fato que esta forma sai da nossa fantasia e não é real. Seria suficiente ter um dia a coragem, de percorrer os lugares onde as reuniões entre adultos acontecem para ouvir, prestar atenção, abrir bem os ouvidos no que é dito, no nada sobre o qual falamos por horas e horas. Falamos sobre o que somos e o que fazemos, onde o fazer vem substituindo o nada do nosso ser.

 É por isso que demoramos para ficarmos calados no Sábado Santo, lutamos para compreender a profundidade do vazio criado pela ausência de Deus no mundo, porque esse vazio, esse silêncio é revelador, esse vazio daquele dia terrível revela o vazio que temos por dentro e que cresce lentamente em todos os momentos do dia. O significado das coisas vem de dentro do mundo, de dentro do homem, da mulher, de seu coração. Apreendemos quando estamos calados, quando entramos em nós mesmos, percebemos nesses momentos que o sentido da vida, o profundo senso de existência não pode advir da matéria, não pode ser algo de material, temporal, acidental.

Deve haver algo a mais, mais duradouro, mais verdadeiro e profundo. Talvez este seja um dos presentes mais profundos do dia terrível, daquele dia cheio de desespero que é o Sábado Santo. É, de fato, neste dia que podemos tocar o nada da matéria, o nada de todos os pensamentos vazios quando são ditados pela pressa de preencher com significado aquilo que significado não tem. É neste dia terrível que descobrimos a nostalgia de Deus, o desejo de seu amor, a beleza de estar com Ele, o significado que Ele e somente Ele pode dar à vida em todos os seus aspectos. É a partir do terrível dia do Sábado Santo que, ao pôr do sol, podemos ver a luz radiante do amanhecer de domingo, o dia mais radiante e brilhante do ano: o domingo da ressurreição do Senhor.

sexta-feira, 3 de abril de 2020

CASA ZOEN TENCARARI - BOLONHA - REUNIÃO DE QUINTA-FEIRA





QUINTA-FEIRA, 2 de abril

Tema da noite: JULGAR

Introdução: A casa Zoen Tencarari é o nome do projeto de acolhida da casa paroquial aonde estou morando desde o mês de outubro do ano passado. A casa hospeda jovens provenientes de vários países (Paquistão, Senegal, Burkina Faso, Albânia, Bangladesh, Itália, Afeganistão, Iran, Madagascar, Gambia, Gabon). Alguns destes jovens se encontram na casa porque não sabiam aonde ir, outros, sobretudo aqueles de proveniência italiana, vieram nesta casa para um período de discernimento, descobrir um sentido diferente de viver. Alguns destes jovens trabalha, outros estudam e outros, aqueles que ainda não tem documentos, ficam em casa ajudando nos trabalhos domésticos. Alguns dentre nós são católicos, outros muçulmanos, ortodoxos, outros ainda não pertencem a nenhuma religião. Vários jovens que estão aqui chegaram nesta casa fugindo de guerras o até de perseguições. Esta experiencia foi implantada pelo pároco padre Mario de 76 anos que depois de passar dez anos nas missões em Tanzânia, na África, quando voltou decidiu de abrir a sua casa para os jovens pobres ou em busca de um sentido da vida. Todo dia as refeições são realizadas por eles mesmos conforme um calendário predefinido. Depois do almoço rezemos juntos a hora media e depois da janta partilhamos a leitura do evangelho do dia sucessivo. Toda quinta feira ás 21,45 h realizamos um encontro formativo sobre temáticas que possam ajudar na vida da comunidade. O encontro termina a meia noite com a adoração eucarística e a benção final. Aqui em seguida, o relatório do encontro de ontem a noite. Todo dia uma équipe prepara o almoço por 35 sem teto da cidade. Nesta época de COVID 19 estamos trancados em casa nos epsaços da paróquia. 


[Presentes: Pe Mario, Elia, Ângelo, Bernard, Maurice, Emanuel, Matteo, Hassan, Latif, Vincenzo, Ahmed, Pe Paolo].


Leitura do texto retirado de: GOPFER, Sandro. 40 dias com Dietrich Bonhoeffer. Um livro para meditação. Brescia: Queriniana, 2020.

É suficiente que as pessoas estejam juntas para começar imediatamente a se estudar, a se julgar, a se classificar. Já pela raiz começa assim na comunhão cristã uma tremenda luta até a morte, da qual muitas vezes não percebemos, que muitas vezes permanece invisível (p. 131).

A busca pela autojustificação e pelo julgamento está intimamente ligada, bem como a justificação pela graça e serviço (p. 132).

Bonhoeffer sabia que o julgamento funciona destrutivamente. Na comunidade, deve haver a regra de que, na ausência do irmão, não é permitido falar sobre ele (p. 133).

Como cristão, vivo pelo fato de ser justificado por Deus, por uma graça maior, e não preciso me fazer justo. Portanto, em vez de emitir sentenças a outros, sou livre para servi-los (p. 134).

Deus, o criador, criou os homens à sua imagem. É por isso que consigo entender a diversidade dos outros como um enriquecimento (p. 134).

Intervenções - partilha
Elia: no momento em que consigo ouvir outras pessoas sem preconceitos, eu as recebo como enriquecimento. Mesmo se somos diferentes, cada um de nós tem algo precioso para dar aos outros. O julgamento é ter uma opinião pessoal enquanto o preconceito deriva da falta de conhecimento (narrativa biográfica).

 Vincenzo: hoje experimento o julgamento como um tópico estranho. Até recentemente, o problema era entender os momentos em que me senti julgado (narrativa biográfica). O julgamento diz de uma idéia que deve chegar a um ponto. Precisa encontrar um equilíbrio. "Não fales mal na comunidade de um na sua ausência": fiquei impressionado com esta frase que lemos.

Bernard. Neste inverno, eu realmente fiz uma revisão dos julgamentos. Farei um trabalho - o professor - em contato com as pessoas. Um erro que terei de evitar é julgar as crianças a priori sem conhecê-las bem. É difícil não julgar. Precisamos ter cuidado, porque muitas vezes não percebemos e somos pesados ​​em julgamentos. Uma frase que li diz: "o julgamento diz muito sobre você, mas menos que o outro". Eu gostei (Narrativa biográfica). Estou seguindo um caminho para reconhecer o julgamento, para reconhecer quando estou errado em corrigir a situação. Às vezes, criamos rapidamente mecanismos de associação sem pensar bem na verdade das coisas. É difícil não mencionar aqueles que estão ausentes na comunidade. É difícil ser honesto, porque há um medo de que o outro o leve a mal.

Emanuel: o tema do julgamento é um tema bastardo porque me machuca. Alguém disse que o medo do julgamento dos outros é uma forma de prisão que não permite que você seja você mesmo. É difícil administrar o julgamento. (Narrativa biográfica).

Ângelo: Pensei nas experiências que tive com relação ao julgamento. Ocorreu-me que sou muito confrontado com o contexto da minha família (narrativa biográfica). Penso que, para não julgar os outros, é necessário se aceitar. Você precisa aprender a se analisar e, em seguida, ser capaz de se aceitar como é. Você também deve aprender a sair do julgamento negativo sobre si mesmo.

Pe Mario: o Papa Francisco falava frequentemente da negatividade do julgamento sobre os outros. Falar mal dos outros é uma arma que mata ou são algemas que o aprisionam. Jesus nos ensina que é o que sai do coração que dói. Quando o julgamento é rápido por parte de outras pessoas, acuso-o, sinto-o. No amor, não podemos nos apressar a julgar, porque o amor nos empurra para o bem e para ver o bem que o outro tem. A vida comunitária é o lugar da correção fraterna. Esse limite de julgamento existe em todas as comunidades. Ratzinger disse que o pecado está dentro da Igreja. Na vida de um casal, é essencial aprender a suspender o julgamento. Um garoto que passou pela casa disse que veio aqui para se preparar para o casamento.

Matteo: morar em casa ajuda muito para não julgar o conhecimento do outro. Só me colocando no lugar dos outros mais do que julgá-lo é que justifico. É necessário aprender a reconhecer a diversidade do outro. Esse processo é mais difícil no local de trabalho, porque existe um desejo de emergir. Quando você está em um grupo e o julgamento nasce, é preciso coragem para sair do refrão e você é julgado (narração biográfica).

Maurice: é difícil não entrar em lógicas negativas para com os outros. Para sair disso, você precisa estar em uma grande paz interior dentro de nós. É preciso muito amor. É como Jesus diz no episódio em que as pessoas trazem para ele uma mulher encontrada em adultério para condená-la à morte. Há momentos em que uma pessoa está dentro de espirais negativas que se tornam difíceis de entender a outra em uma perspectiva de amor. Receber amor ajuda a ter uma aparência diferente (narração biográfica). Às vezes, outros são julgados negativamente por se elevarem. São lógicas nas quais todos caímos. Quando isso acontece, significa possuir baixa auto-estima. Começando a se amar, não há mais necessidade de se auto-exaltar e abaixar os outros. É a lógica de amar o seu próximo como a si mesmo. O julgamento negativo não leva a lugar algum. Quem tem raiva por dentro geralmente é a pessoa que dá sentenças. Você está com raiva e depois julga mal todo mundo. É por isso que é certo parar de falar em comunidade quando alguém está ausente.