Paolo Cugini
Estava
falando o outro dia com um meu amigo por telefone e me chamou atenção uma
coisa. Enquanto eu estava partilhando a minha vida presente, os trabalhos
pastorais na nova paroquiam, o trabalho como professor na faculdade, ele ficou
lembrando somente os velhos tempos que foram. Logo não percebi o teor do diálogo,
mas depois, pensando a esta conversa, fiquei matutando dentro de mim e me
questionando: porque será que esta cara falou somente do seu passado? Será que
não tem nada de bom no seu presente? Qual é o seu problema?
Ainda
hoje assistimos a situações deste tipo não apenas em conversas entre amigos,
mas também em situações políticas e sociais. Lembro o papo furado de um
candidato a prefeito de uma das cidades em que passei nestes anos de Bahia.
Toda vez que pegava no microfone, seja ele qual for o contexto, sempre fazia
questão de citar a construção daquilo que ele pomposamente chamava de “O maior
prédio escolar da Bahia”. Anos de administração publica pífia e amiúde
corrupta, eram justificados somente com a referência a um passado glorioso que
não existia mais, conseguindo a enganar o presente do povo pobre, com um
discurso vazio feito de lembranças passadas. Quanta gente vive desfrutando o
próprio passado de glória! Quanta gente se sentou sobre as cinzas quentinhas
deu um passado glorioso, ou até heroico, mas que depois não correspondeu a um
presente do mesmo teor. Quanta gente se acomodou sobre os heroísmos da própria
juventude, sobre as conquistas realizadas no passado, mas que depois não
tiveram continuidade, acomodando-se no sofá da vida, vivendo de lembranças do
tempo que foi e que nunca será mais. Quantas pessoas encontrei que estufam o
peito falando das lutas sociais realizadas no passado quando eram pobres
lascados e hoje estão com o bolso cheio! Quantos fantasmas encontramos nas
praças das nossas cidades, fantasmas de pessoas que já eram e que não são mais,
pelo simples fato que renunciaram a lutar, a viver o próprio presente,
satisfeitos das migalhas que ganharam com o passado de glória. Quantas pessoas
aprenderam a preencher o vazio da própria vida com as lembranças do tempo que foi
renunciando a viver o próprio presente, a saborear a novidade da vida!
O
problema é que o passado não volta e, sobretudo, não existe, pois existe
somente o presente. Quem vive só de lembranças não consegue saborear a força e
a novidade do presente e, em outras palavras, não consegue viver uma vida autêntica.
Esta reflexão tem também um sentido evangélico. De fato, já o profeta Isaias
convidava o povo a esquecer do passado para se concentrarem na vida presente,
que Deus estava querendo realizar. O mesmo Paulo na carta aos Filipenses dizia:
“Por causa de Cristo tudo o que eu
considerava como lucro, agora considero como perda” (Fil 3,8). É no
presente da nossa vida que Deus vem ao nosso encontro. A atenção aos sinais dos
tempos que o Senhor coloca na nossa vida para nos mostrar o Caminho, exige uma
constante atenção ao presente da história. Quem vive com a mente constantemente
virada ao passado, não consegue perceber a passagem do Senhor no presente da
vida e, assim, fica endurecendo o coração, se tornando resistente à Palavra de
Deus, insensível à ação do Espírito Santo. Sobretudo, porém, quem vive fora do
tempo, perde uma ocasião propicia para se converter e colocar a própria vida na
trilha que o Senhor traçou.
Quantas
vezes nas paróquias em que passei, nas comunidades que encontrei, deparei com
situações como esta! Quantas vezes nas paroquias e nas comunidades de base
encontrei pessoas com a cabeça virada no passado, incapazes de colher a
novidade da presença do Senhor na história! Quantas discussões, incompreensões
por causa disso, pela incapacidade crônica de escutar a novidade, amarrados num
passado que, graças a Deus, nunca irá voltar. Somos humanos e humano é o medo
da novidade presente. A vida espiritual deveria servir a isso, ou seja, a
caminhar de cabeça erguida, fitando a glória do Senhor ressuscitado que está na
nossa frente, para que no nosso presente possamos colocar sinais da sua
presença. A vida espiritual se realiza no diálogo cotidiano como o Senhor da
vida e da história que aponta a novidade do caminho que precisamos percorrer.
Que o grito do Senhor que encontramos no livro da Apocalipse: “Eis que faço nova todas as coisas”
possam encontrar discípulos e discípulas acordados e não dormindo sobre os
sonhos do passado, mas atentos para os novos desafios que o Senhor coloca na
nossa frente.
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