sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

AKEDIA: O MAL OBSCURO

 





Paolo Cugini

 

Lembrei nestes dias de um livro de espiritualidade que li alguns meses atrás e que falava de um mal obscuro chamado akedia (é uma palavra grega que, em português, poderia se traduzir com preguiça), que seria uma tristeza profunda da alma, que se manifesta quando a pessoa perdeu o sabor da vida. Esta situação existencial se transforma em preguiça, na falta de vontade de qualquer coisa, levando a vida do jeito que vier. A akedia é a incapacidade de ver no horizonte algo que possa valer a pena de lutar para alcança-lo. Segundo Gabriel Bunge – um mestre espiritual contemporâneo e estudioso da vida monástica - na raiz da acedia está a frustração para um desejo não realizado. E assim a akedia vai se insinuando devagarzinho na alma da pessoa ao ponto de se tornar um estado de vida permanente, imobilizando a pessoa. Este mal espiritual se manifesta na aversão à tudo aquilo que tem a disposição e, ao mesmo tempo, um desejo por tudo aquilo que não é ao seu alcance. Esta situação da alma se manifesta seja na vida matrimonial que religiosa. É o detestar aquilo que se tem – marido, mulher, filhos, etc. - e o desejar aquilo que não tem (outra mulher, marido, casa, situação financeira, trabalho, etc.).  Acontece quando a pessoa não consegue mais vislumbrar no seu presente algo de estimulante e, ao mesmo tempo, se torna incapaz de formular novas motivações, transferindo a própria tensão emotiva em desejos inalcançáveis, fora da realidade e, por isso, a situação se torna frustrante ao ponto da criar um círculo vicioso que amiúde desemboca nas formas depressivas. A akedia é a consequência deste processo de desmanche do eu consciente, pois a frustração chega ao ponto de aniquilar até a capacidade onírica da pessoa, deixando-a totalmente esmagada num presente no qual não se percebe mais nenhum sentido da vida. Segundo Gabriel Bunge não é raro que a akedia, nas suas formas mais agudas, chega até ao ponto do suicídio.

É possível sair desta situação lastimável? A akedia, este mal obscuro da alma, tem remédio? Segundo Gabriel Bunge sim. O primeiro remédio é resistir. Durante o período em que se sente forte a tentação da fuga, da mudança da situação existencial, o primeiro remédio é ficar ai, permanecer com paciência e esperar tempos melhores. Pode ser um remédio ridículo, mas não é. Um dado importante na vida espiritual é a necessidade de suspender qualquer tipo de decisão nos momentos de crise, de instabilidade. Perseverar na própria situação de vida, derrubando toda fantasia de fuga é um grande exercício de ascese, que deve ser acompanhado do esforço constante de levar em frente os compromissos assumidos, também se a vontade é fraca. O trabalho é sem duvido um grande instrumento nos períodos em que a preguiça – akedia penetra na alma. Nestas situações precisa fazer de tudo para não deixar a tristeza tomar conta da alma e, assim, o trabalho é um caminho de saída significativo. A pessoa que vive a akedia precisa de um grande autodomínio, que é um dom do Espírito Santo, que permite à pessoa de não deixar o barco da vida desandar. Nesta perspectiva, percebe-se que a akedia, enquanto ameaça a alma no sentido profundo das suas aspirações, ao mesmo tempo se torna instrumento para aprimorar a própria vontade e reorganizar as motivações da vida andando em busca de novos sentidos, mais conforme à nova situação existencial.

Sem dúvida nenhuma para quem é tomado pela akedia, a oração constante e profunda se torna o clima espiritual propicio que permite a alma não apenas de respirar nestes momentos de sufoco, mas, sobretudo, de captar a presença consoladora do Senhor. “Pesada é a tristeza –dizia o padre Evagrio, grande e profundo pai espiritual do IVº século d. C. – e insuportável a akedia, mas as lagrimas dirigidas à Deus dom mais poderosas de ambas”. As lagrimas são o reconhecimento silencioso da nossa necessidade de sermos salvos. Famosas são as lagrimas de Pedro, ou da mulher pecadora. Pedimos ao Senhor a humildade de derramarmos lagrimas de misericórdia para acolhermos a sua salvação. 

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