Paolo
Cugini
Esta foi a minha
consideração final ao final dos três dias do Fórum com Cristãos LGBT (Lesbicas,
Gays, Bissexuais, Transexuais), ao qual partecipei em Albano Laziale. Eles
querem nada mais do que isso: viver como todo mundo. Esta
é uma resposta simples e banal à clássica questão de que pessoas decentes,
aquelas pessoas que pensam que estão certas e verdadeiras, pelo simples fato de
se sentirem normais (eu não escrevi: é isso, mas parece): que o que esses caras
querem? Eles querem viver, minha querida senhora
homofóbica; eles desejam viver livres e não julgados, meu caro senhor, da
porta ao lado, que te enoja só de ouvir a palavra homossexual ser
mencionada. É este dado existencial muito simples que compreendi nestes
belos dias de amizade, estudo, oração e partilha.
Enquanto ouvia os
relatos, participava de grupos de trabalho, rezava, me perguntava: mas por que
chegamos a tal ponto que as pessoas têm que esconder sua identidade, por medo
de repercussões, não só na família, mas também no trabalho e também - lamento
muito a dizer, mas é a verdade - na Igreja. O que aconteceu?
Ouvir os testemunhos de
cristãos homossexuais, de seus pais (fiquei particularmente impressionado com
os testemunhos de algumas mães), de seus sofrimentos muitas vezes causados
por homens da Igreja, que usam a doutrina como facão sem qualquer escrúpulo,
forte da identificação doutrina-verdade, me pergunto: a que serviram séculos de
filosofia e teologia, se não conseguiram derrubar preconceitos ancestrais
injustificados no pensamento ocidental, sustentados apenas por razões
artificiais, criados para salvar a opinião comum? Embora durante décadas a
ciência afirme que existem pessoas que nascem homossexuais, a cultura em que
nascemos e na qual estamos imbuídos, rejeita este fato confirmado pelas mesmas
pessoas em causa. Bastaria parar e ouvi-los. Como padre digo:
bastaria levar a sério os depoimentos ouvidos nas confissões, para entender que
na doutrina católica que declara " a inclinação
homossexual objetivamente desordenada " , há algo que não
funciona, algo que não é inerente à realidade. Quando a teologia não
explica a realidade, ou a explica em parte, remendando o que, por
pré-compreensões culturais, não consegue compreender, significa que tomou o
caminho da ideologia e, como sabemos, qualquer ideologia é tendenciosa, defende
interesses, provoca divisões dentro e fora das pessoas.
Como a teóloga Cristina Simonelli,
atual presidente das teólogas italianas, argumentou em seu discurso no V Fórum
de Cristãos LGBT: “O catecismo da
Igreja Católica é uma síntese datada, certamente não eterna ou intangível:
como prova, a legalidade de pena de morte, até mesmo a desordem objetiva pode ser removida! É,
portanto, um documento que merece respeito, sim, mas também compreensão
histórica, crítica, teológica e, portanto, debate”.
Acompanho cristãos LGBT
como pastor há apenas dois anos e já cansei de ouvir a hipocrisia da Igreja a
que sirvo, que usa as palavras mágicas de acolhimento e inclusão sem então, por
outro lado, oferecer o seu conteúdo. Fico espantado quando ouço as lindas palavras
de boas-vindas daquela minha Igreja, que depois expulsa vulgarmente do
confessionário irmãos e irmãs que se ajoelham para pedir misericórdia. O
que é isso? Sobre o que estamos conversando? Acima de tudo:
percebemos os desastres que estamos criando em nome de um Evangelho que o mundo
não reconhece em nossas escolhas e em nossas atitudes esquizofrênicas? Com
a boca, de fato, dizemos algo, enquanto com nossos gestos o negamos. Por
que não permitimos que um homossexual leia na igreja ou faça catecismo (neste
tópico específico, a literatura é desagradável e vergonhosamente
enorme)? Como você pode dizer aos cristãos LGBT " Bem-vindo à
comunidade " e depois bispos e padres proíbem a realização de
vigílias pelas vítimas da homofobia?
Quanta vergonha e quanto
embaraço me senti nestes dois anos em que junto com amigos e amigas do grupo
organizamos vigílias de oração e fomos bárbaramente e violentamente agredidos
por aqueles mesmos irmãos e irmãs que no domingo nos encontramos em volta da
mesma mesa do Senhor para ouvir sua própria Palavra e se alimentar de seu
próprio corpo. Por que essas coisas acontecem? O que eles
fizeram? Eles não têm o direito de orar como todos os outros? Por que
você, que foi posto para ser o pastor em conformidade com o Evangelho do
Senhor, bate as portas na cara desses irmãos?
Quem há anos trabalha com
os cristãos homossexuais sente que, graças também aos impulsos e estímulos
doutrinais do Papa Francisco, é chegado o momento de ousar mais alguns passos
no sentido de uma acolhida que se sustente numa nova elaboração doutrinal e
teológica. Foi o que recordou a irmã Fabrizia que, durante dez anos, junto
com as irmãs dominicanas, abriu as portas do mosteiro de Florença. Depois de relembrar que: “ nossas comunidades
cristãs, que em sua maioria condenaram as pessoas LGBT presentes a se
esconderem, deixando a suspeita de um vínculo sutil entre a condição
homossexual e a perversão moral, devem reconhecer que traíram o olhar de bênção
de Deus , "Irmã Fabrizia acrescentou que " por
como a conversão pastoral é importante, estamos convencidos de que isso não é
suficiente. Acreditamos que a teologia é chamada hoje a repensar com
coragem, de acordo com sua vocação específica para a pesquisa, as questões
relativas ao mundo LGBT”.
Nossos irmãos e irmãs
LGBT estão nos fazendo crescer, estão nos ajudando a tirar o véu da hipocrisia
de nossos olhos, estão nos ajudando a entender o evangelho, tornando-se assim
um lugar hermenêutico incrível. Por isso, somos gratos a você e oramos
para que nossos pastores-bispos também saiam de palavras fáceis e atitudes
fáceis de maneira o mais rápido possível, para finalmente reconhecer o dom da
graça que Deus deu à sua vida homossexual.
Parabéns Paolo Cugini!
ResponderExcluirTexto mais que necessário em tempo sombrios em que vivemos. Tempos de pura hipocrisia e falsas ideologias do bem e da família tradicional brasileira. Vivemos em uma sociedade em q o amor que Cristo pregava foi esquecido e silenciado por um fundamentalismo religioso perverso e assombroso. Somos LGBT+ e queremos respeito e viver!!
Abraços,
Olinson Coutinho
Padre Paolo cada dia me orgulho de ser sua amiga. Quiçá a Igreja tivesse várias pessoas como você, que está sempre a serviço do irmao; sempre a serviço da evangelização, de buscar almas, independente quem sejam, e, quanto ao julgamento dessas almas, Deus cuida e não o homem.
ResponderExcluirEsse deve ser o papel da Igreja: ACOLHER, APOIAR, AMAR.....
Parabéns pelo belíssimo trabalho. Parabéns pela coragem , parabéns por amar tanto nossos irmãos.
Me orgulho de você!
A hipocrisia do ser humano é sem limites. Desde quando uma cor de pele ou uma orientação sexual definem o caráter de uma pessoa? Cristo veio há mais de 2000 anos nos ensinar a sermos puros de coração, a amarmos uns aos outros, a não julgar, sendo assim não condenar, a partilharmos o pão a sermos mansos e humildes.... inúmeros. Porquê o homem prefere fazer exatamente o contrário? Deus sabe....
ResponderExcluirEsse é um tema bastante complexo pois, no mundo atual, individualista, excludente, acostumado a apontar o defeito dos outros, muitas vezes somos incentivados a excluir, julgar, recriminar e não se importar com o sofrimento do outro. "Aquele que de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire a pedra…"João 8, 1-11.
ResponderExcluirInicialmente é preciso entender que todos somos pecadores e não cabe a nenhum de nós julgar. Acredito que a igreja, assim como todos os cristãos precisam parar de julgar as pessoas e aprender a acolhê-las. Acolher, não significa julgar nem tampouco apontar defeitos. Acolher significa ajudar o irmão a se encontrar verdadeiramente com o Pai que é amor. "Quem não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. 1 João 4,8".
Quando olhamos o ser humano pelos olhos d deus sentimos no direto d lutar por eles .se é pra defender os direitos humanos lutar sempre
ResponderExcluirBem-vindo ao mundo dos hipócritas — deveria dizer. Mas não me atrevo a achar que este é o mundo que por aí estar, deve ser. Como todas as outras instituições que disputam o poder, a igreja não se diferencia, mas também se esconde atrás de um slogan: Deus é amor e pregamos o bem, a justiça, a igualdade. Assusta-me a coragem em dizê-lo, num mundo em que, sem máscaras, não somos bem aceitos. Todos nós inventamos comportamentos para que a aceitação aconteça. É esse o lema. Ser sincero, transparente, fiel, são caminhos para a exclusão. Não me interessam os rótulos, não frequento igrejas, não puxo-saco pra obter vantagens e não me canso de me indignar. A boca manda levantar bandeiras, mas as ações colocam tarjas pretas. Os LGBTs, felizmente, parecem começar a levantar a poeira e quem tiver suas casinhas de cristal que fechem as portas. Acho que está mais do que na hora de a verdade ressurgir e a humanidade deixas as máscaras só para momentos de pandemia, quando mesmo assim, os olhos descobertos continuam sendo as janelas da alma. E que a corja que nos comanda perca espaço e voz. Que belo trabalho, Pe. Paolo. Pena gente assim ser tão escassa.
ResponderExcluirÉ muito errado esse tipo de julgamento, só um que pode julgar agente, e esse alguém é Deus. Temos que amar as pessoas e aceitar do jeito que elas são, porque ninguém é igual, cada um tem seu jeito e sua maneira de viver.
ResponderExcluirPrimeiro parabenizo Pe Paolo pela coragem e pelo brilhante texto. Vivemos um momento estranho em um mundo onde a intolerância está a cima de tudo. Vivemos a barbárie de uma doutrina baseada em valores falsos. Basta ver o Cristo com a mulher adúltera. Isso em um tempo de valores falsos e Cristo deu uma lição. Hoje o que Cristo faria diante de uma pessoa LGBT? Será que ajudaria os cristãos jogarem pedra? A nossa igreja precisa olhar para dentro e fazer uma alto crítica de sua representação clerical. Eu não sou um especialista no assunto, mas como cristão precisamos sentir e praticar a compaixão com aqueles que sofrem. Ab
ResponderExcluirParabéns Pe. Paolo! Como é gratificante ser sua amiga, não tenho para descrever. Percebe que Deus abençoe o Senhor nesta missão de acolher aos irmãos excluídos. E realmente só quem pode julgar os nossos atos
ResponderExcluiré Deus. E ele acolhe. Excelente texto.
Pe. Paolo, muito sábio, como sempre! Esse texto se faz muito necessário nessa época em que vivemos, sobretudo por conta das pessoas que se dizem a serviço de Deus e se esquecem do próximo por conta do preconceito que já está enraizado no seu ser...
ResponderExcluirTextos como esse me deixam muito contente, por ver que ainda têm pessoas que realmente se preocupam e se importam!
O grande arcebispo sulafricano da igreja anglicana Desmund Tutu, escreve uma obra mui significativa e exponencial de provocações/transformações pessoais e coletivas no cenário religioso e também sociocultural, intitulada: Deus não é Cristão e outras provocações... Nessa obra peculiar, há uma invocação e transferir integral da impostação e desvelamento da Filosofia Africana do UBUNTU: O MEU EU SÓ EXISTE EM DETRIMENTO DO EU QUE EXISTE EM VOCÊ, sou, porque somos juntos - o nós, independente de cor, Raça, gênero/orientação sexual, credo religioso, etc., O eu que há em mim é extensão do outro eu que há em você... Infelizmente os colonizadores não assumiram tal premissa ao invadir e aniquilar os nativos indígenas e sua cultura predominante e existente aqui no séc. XVI... Assim se deu in África... Assim se deu com o nazifascismo e as barbáries de seus líderes genocídas... ASSIM foi com as ditaduras militares, em especial na América Latina e aqui no Brasil... Assim foi o Apartheid na África...E, agora, se repete a mesma história de desrespeito e violação à dignidade da pessoa humana independente de cor , sexo . class, gênero ao ser banalizadas, rejeitada e ignorada pelo Estado e as Instituições... Por fim, evoco o Filósofo francês do séc XX Emanuel Levináz com a fenomenologia da ALTERIDADE EA EPIFANIA DO ROSTO DO OUTRO.... O outro é um fenômeno, um ser sagrado, dado aí. O outro, independente de tudo, deve ser totalizantemente querido e respeitado. A alteridade, pede os princípios da psicologia da Empatia/Entropatia: você jamais será igual ao outro, mas pode se ver no espaço e condição deste outro! Para tanto, resta-nos uma pergunta fundamental: Que é isto o outro, que é isto o outro LGBT?
ResponderExcluirA RESPOSTA É SIMPLES: O eu do outro que necessita ser respeitado, amado, querido e incluído integralmente na sociedade; é aquele que tem na sua EPIFANIA o fenômeno da existência como ser que é! É o Eu que também grita e está no TOTALMENTE OUTRO!
Prof. Esp. Tobias
Parabéns! Reflexões mais que necessárias. O mundo precisa urgentemente de mais pessoas que pensem e ajam como você. 👏👏👏
ResponderExcluirInfelismente alguns não olham pra dentro de si , não fazem exames de conciência de seus pecados , indiferentes com às diversas situações de nossos irmãos, onde deveríamos buscar soluções de vida e libertação ,exclue, despreza causando mortes .
ResponderExcluirDepois vai chorar ao redor do caixão. Talvés seja tarde demais.
Presenciei recentemente , algo deste tipo.
Padre Paolo Deus lhe forças para ser sempre o Cirineu que ajudou Jesus , no peso dos sofrimentos da humanidade.
Maria Creuza Menezes de Souza
Quando o ser humano começa a enxergar o outro por inteiro,conhece a sua essencia,tudo muda o mundo se torna melhor.Belissimo texto.
ResponderExcluirPr Paolo e suas sábias reflexões parabéns por está s more abrindo nossas mentes para entender as coisas. grata por suas palavras
ResponderExcluirParabéns pr Paolo e suas belas reflexões sábias o mundo seria outro se a
ResponderExcluirPalavras sábia, isso é ser Cristão! Acolher se colocar no lugar do outro: sensibilidade, humanização são características que devem estar presente em qualquer situação inusitada, principalmente em questão pessoais de escolhas de gênero sexual que perpassa pôr um momento de profunda crise que a bíblia por ser interpretada de forma equivocada de modo especial os conservadores que nada têm há ver com a realidade posta em discussão, bastante pertinente é Jesus Cristo falando usando a pessoa do Senhor Pé.Paolo.Opção sexual têm que ser respeitada o mundo urge por respeito;Eu,Tu,Nós,Vós,ele,(s)ela(s). Precisam só viver as religiões devem repensar que a humanidade está cansada de falsos dogmas religiosos e com todo respeito aos irmãos só o amor constrói a transformação de preconceitos inrraigado em uma cultura perversa que marginaliza os homossexualismo.Eles conhecem a Deus tanto com todos.
ResponderExcluirBoa tarde o que eu quero falar sobre esse texto é que cada um quer viver sua vida Como quer e eu acho que o certo em cada um viver do seu jeito Quem Somos Nós para julgar o outro o que devemos fazer e deixar o ser humano viver em paz do jeito que eles são porque na verdade se é pecado ou não cabe a Deus para resolver os problemas de cada um e não nós intrometer na vida do ser humano cada um tem o seu jeito de ser e basta nós respeitá-la
ResponderExcluirExcelente reflexão Padre Paolo.Tratar de um tema desse dentro de uma instituição onde a maioria das pessoas são conservadoras e levar esse debate pra dentro dela é extremamente positivo! O mundo tem espaço pra todos, não podemos mais aceitar qualquer forma de desrespeito e exclusão, por isso que sempre julguei o teu trabalho como fundamental! Parabéns!
ResponderExcluirO problema da homoafetividade na Igreja é cercado de tabus e de conveniências. Não se pode mais manter uma elaboração teológica que não leve a ciência em consideração, permanecer com uma interpretação bíblica anacrônica e obsoleta não gera vida e nem faz amadurecer a consciência humana para a boa vivência da sexualidade.
ResponderExcluirAlém disso, é muito cômodo manter as coisas como estão, pois assim, as feridas institucionais não serão mexidas. Mas é preciso sim, colocar o dedo na própria ferida, afinal, homoafetivos não faltam dentes das instituições religiosas, ou estão camuflados, ou estão vivendo uma sexualidade desordenada e gerando escândalos.
Por isso, urge uma teologia e uma doutrina mais sólida e coerente com a perspectiva do amor cristão que não concebe exclusão ou violência, mas é COMUNHÃO.
Com tudo o que tenho lido de seus textos resta-me apenas uma pergunta: Quem é este Apóstolo? De onde lhe vem tamanha sabedoria? Por onde anda ele? Que coragem é esta que pode leva-lo a experimentar perseguições, à semelhança do que aconteceu com S. Paulo? Precisamos da sua voz na Igreja Padre, para romper com tantos pre-conceitos (conceitos criados antes de experienciar aquilo que chamam de pecado)? Não tenho nem palavras para descrever a sua sapiencia. Bem haja sr. Padre. Que Nossa Senhora de Fátima seja a sua guia na escuridão a que muitas vezes a nossa Igreja mergulha, para que o Sr. Padre sempre consiga vislumbrar no horizonte a Cristo Jesus, abençoando seus passos, suas obras, suas palavras.
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